Os empresários agrícolas que se dedicam às grandes culturas em Portugal, com destaque especial para os que se dedicam às culturas cerealíferas, enfrentam um duplo desafio: por um lado, a necessidade de obterem margens de competitividade económica aceitáveis, por outro, a obrigatoriedade de preservação dos recursos naturais (solo, água, biodiversidade), através da eliminação ou redução de todo e qualquer potencial impacto negativo.

No caso do Vale do Baixo Mondego, uma das principais manchas de solos altamente produtivos do nosso país, a produtividade média atingida atualmente pelas culturas de milho-grão e de arroz, decorre de uma forte incorporação de inovação tecnológica, que passa pelo recurso a novas variedades e soluções ao nível da fertilização e da proteção vegetal, a par com a melhoria dos sistemas e tecnologias de rega, entre muitos outros fatores.

Conciliar “intensificação” e “sustentabilidade” leva os empresários a adotar novas soluções agronómicas na gestão das atividades produtivas. É o caso da cobertura do solo durante o período mais pluvioso do ano agrícola, após a colheita da cultura principal.

As culturas de cobertura, também designadas como culturas intercalares por serem introduzidas na rotação ou sucessão de culturas, ao ocuparem o solo no período Outono/Inverno, evitam a erosão e minimizam as perdas de nutrientes por lixiviação, promovem a melhoria das características físicas, químicas e biológicas do solo, nomeadamente a sua estrutura, descompactação e o teor de matéria orgânica, contribuem para o resgaste de carbono numa altura do ano em que o solo se encontra praticamente nu, contribuem para o controle de infestantes, pragas e doenças, incrementam a atividade dos polinizadores e a fauna auxiliar das culturas e da microfauna do solo, permitem o cumprimento de regras e compromissos estabelecidos pela política agrícola prestando, por isso, importantes e reconhecidos serviços dos ecossistemas.

Apesar das múltiplas vantagens que apresentam quer para a defesa e melhoria destes solos quer para a rentabilidade dos empresários, a sua sementeira e implantação com sucesso nem sempre se revela alcançável, em face das características dos próprios solos e das aleatoriedades climáticas, cada vez mais frequentes.

Importa, por isso, encontrar soluções agronómicas que, não prejudicando a obtenção de bons resultados económicos aos empresários agrícolas, se revelem eficazes no âmbito dos eco-regimes, para a preservação e melhoria da qualidade dos solos do Vale do Baixo Mondego.

A escolha da família, da espécie e da variedade da(s) cultura(s) de cobertura a utilizar (Figuras 3 a 5), deve ser decidida de acordo com a(s) atividade(s) da exploração agrícola, dimensão, solo(s), topografia, etc. e os objetivos pretendidos com a instalação da(s) cultura(s).

Figura 3 a 5. Diferentes culturas de cobertura semeadas no INOVMILHO, Coruche, 2024 (A. Jordão, CCDRC)

Por outro lado, o custo de instalação das culturas, por contraponto aos benefícios já anteriormente referidos, a adequação do parque de máquinas e a capacidade do empresário para realizar com oportunidade as operações de instalação e de corte ou colheita, bem como o aproveitamento e o destino a dar à biomassa produzida são fatores a considerar na inclusão das culturas de cobertura no sistema produtivo da exploração.

No entanto, os fatores abióticos (precipitação, temperatura, solo, radiação solar, etc.) são aqueles que porventura mais condicionam a instalação e os resultados a obter com a introdução destas culturas na rotação.

As especificidades edafoclimáticas do Vale do Baixo Mondego, como as temperaturas e o número de horas de luz, mas sobretudo as precipitações ocorridas no final do Verão/princípio do Outono e a existência de solos menos permeáveis e com pior drenagem, são os principais constrangimentos à instalação das culturas de cobertura enquanto práticas agrícolas que apoiam os eco-regimes e consideradas como estruturas agroecológicas.

Em face destas condicionantes, dever-se-á optar por solos franco-arenosos e pouco suscetíveis ao encharcamento e selecionar as espécies mais adequadas aos mesmos, não descurando os objetivos que se pretendem atingir ao introduzir as culturas de cobertura na rotação ou sucessão cultural.

Da análise do Gráfico 1 verifica-se que, em quatro (2019, 2020, 2022 e 2023) dos últimos sete anos, a precipitação acumulada ocorrida entre outubro e dezembro foi superior a 500 mm, um fator muito adverso para as sementeiras e o início do desenvolvimento das culturas de cobertura (…)

→ Leia este e outros artigos completos na Revista Voz do Campo edição de novembro 2024, disponível no formato digital e impresso.

Autoria: António Jordão ¹, Carlos Alarcão ¹ e Anne Karine Boulet ²

¹ Polo de Inovação de Coimbra da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro
² Instituto Politécnico de Coimbra/Centro de Estudos de Recursos Naturais, Ambiente e Sociedade – CERNAS

(*) CCDRC – Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro