Ao longo dos tempos, assistimos a uma tentativa de, forçosamente, adaptar as nossas galinhas às condições de produção que mais optimizam a eficiência na postura de ovos, enquanto procuramos dar resposta às exigências do mercado relativamente à qualidade, segurança, aprovisionamento e preço do produto final.

Numa equação em que entram tantas variáveis, as necessidades essenciais para a produção tornam-se prioritárias. De seguida, na eventualidade de existir margem que o permita, atendemos às necessidades comportamentais adicionais dos animais que criamos. No caso das galinhas poedeiras, o Decreto-Lei n.º 72-F/2003, de 14 abril dispõe as normas essenciais para o melhoramento do bem-estar das galinhas poedeiras.

Mas do que precisam as nossas galinhas que não vem descrito nos decretos-lei?

Ora, uma galinha poedeira é definida, segundo a legislação, como “as aves da espécie Gallus gallus que tenham atingido a maturidade sexual e sido criadas para a produção de ovos não destinados à incubação”.

No entanto, é consensual que uma galinha poedeira não se limita a ser uma ave destinada a produzir ovos. Em boa verdade as galinhas domésticas pertencem à subespécie Gallus gallus domesticus que são, por definição, animais gregários que vivem em grupos organizados onde existe um macho dominante e as fêmeas se organizam hierarquicamente entre si, formando pequenas famílias de 10- 30 indivíduos. Estas aves alimentam-se de grãos, plantas, frutos, larvas, minhocas e diversos insectos e aracnídeos. Quando dada a oportunidade, uma galinha adulta passará entre 30% e 50% do seu tempo activo a exibir comportamentos forrageiros e de investigação, explorando o meio em que vivem, guiadas por uma curiosidade inata e um apurado sentido de visão e de olfacto. Debicar, provar e cheirar elementos do ambiente que a rodeia, escavar e esgravatar o solo e aprender com outros elementos do grupo possibilita que as galinhas tenham acesso a uma variedade considerável de alimentos, mesmo em condições de maior escassez.

O restante tempo activo é ocupado com comportamentos de cuidado da plumagem como o alisar e limpar de penas e os banhos de areia/pó, que constituem uma importante arma de combate a parasitas externos como ácaros e piolhos; comportamentos sociais como grooming mútuo, estabelecimento de ordens hierárquicas, vocalizações, aprendizagem e observação; e outros como a vigilância contra predadores e comportamentos reprodutivos, busca de ninho, postura de ovos e incubação dos mesmos.

Em sistemas de produção em que o acesso a condições que proporcionem a exibição de tais comportamentos é limitado, na tentativa de compensar esta necessidade resta-nos tentar fornecer às nossas galinhas um número de elementos que conhecemos por enriquecimento ambiental.

São bons exemplos de enriquecimento ambiental para grandes bandos a palha e fardos para saltar e fornecer um substrato para debicar (Figura 1), blocos para debicar – alguns podem ter efeitos de limagem do bico podendo não ser adequados para bandos com exageros no corte de bico; outra variedade de objetos para debicar como cordas de algodão, caixas para banhos de areia por exemplo com substrato arenoso misturado com pó de diatomáceas para controlo de parasitas externos (Figura 2), luz natural: varandas cobertas ou janela e claraboias ou simples grãos de cereais e feno, erva ou palha dispersos pela cama/solo.

Apesar dos esforços, estas medidas são na sua maioria insuficientes para combater as altas densidades animais e a intensidade produtiva a que estas galinhas são sujeitas. Na tentativa de prevenir as consequências graves que advêm de comportamentos agressivos entre aves, o corte de bicos é uma prática amplamente aplicada na indústria avícola moderna. Estes comportamentos podem resultar em perdas consideráveis da plumagem e escalar para lesões de pele, feridas abertas e comportamentos de canibalismo dentro do bando (…).

→ Leia este e outros artigos na especial reportagem sobre a Avicultura na Revista Voz do Campo edição de novembro 2024, disponível no formato digital e impresso.

Autoria: Catarina Stilwell, Médica Veterinária, Concerta – Agribusiness Consulting
*Escrito no âmbito do antigo acordo ortográfico