O controlo de Salmonella spp. continua a ser um dos maiores desafios da produção avícola moderna, com implicações diretas para a saúde pública e para a competitividade do setor.
Segundo a Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA), o consumo de ovos e produtos derivados são a principal fonte de salmonelose humana, sendo esta a segunda doença transmitida por alimentos mais reportada (Pinedo et al. 2022). Isto reflete-se numa perda económica global superior a € 3 mil milhões/ano.
Os ovos podem ser infetados por contato com fezes contaminadas (via externa) ou antes da postura devido à presença de Salmonella spp. nos órgãos reprodutivos das galinhas poedeiras (via interna), ou ainda durante a fecundação se o galo estiver infetado. Além dos riscos para a saúde humana e animal, a produção de ovos diminui com a presença de Salmonella spp. nos órgãos reprodutivos das galinhas. A utilização de antibióticos como medida profilática foi uma das estratégias mais utilizadas no controlo de infeções causadas por Salmonella spp. em aves, no entanto, a disseminação da resistência antimicrobiana (AMR) em várias espécies microbianas levou a proibição de tais estratégias (Abreu et al. 2023). Na busca por práticas mais sustentáveis, surgem abordagens inovadoras para a prevenção e controlo de Salmonella, que integram avanços tecnológicos que visam reduzir o impacto ambiental e garantir a segurança alimentar. Neste artigo, exploramos práticas recentes, com destaque para vacinas, probióticos e novas soluções biotecnológicas.
Programas Nacionais de Controlo de Salmonella (PNCS)
A implementação de programas de controlo de Salmonella spp. em âmbito nacional e europeu tem fomentado uma cooperação integrada e multidisciplinar. Esse novo modelo de atuação concentra-se na prevenção, na deteção precoce, e na capacitação de respostas eficazes e eficientes no controlo deste agente zoonótico.
O Regulamento (CE) N.º 2160/2003 estabelece a necessidade de adotar medidas eficazes para detetar e controlar a presença de Salmonella spp. em todas as fases da produção, visando reduzir a sua prevalência e minimizar o risco à saúde pública.
Desde 2006, a Direção Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV), tem implementado o Programa Nacional de Controlo de Salmonella spp. com o objetivo de reduzir a presença deste patógeno em aves e alimentos, além de gerar dados epidemiológicos essenciais para o desenvolvimento de estratégias de intervenção eficazes a nível nacional e europeu.
Este programa foi introduzido gradualmente em colaboração com o setor e está atualmente em plena execução as seguintes ações:
– “Programa Nacional de Controlo de Salmonelas em bandos de reprodução Gallus gallus”;
– “Programa Nacional de Controlo de Salmonelas em bandos de galinhas poedeiras Gallus gallus”;
– “Programa Nacional de Controlo de Salmonelas em bandos de frango de engorda Gallus gallus”;
– “Programa Nacional de Controlo de Salmonelas em bandos de perus de engorda”.
Vacinas para Salmonella spp.: Evolução e Impacto
No caso da produção avícola, há um grande desafio no controlo de infeções por Salmonella spp. devido à diversidade genética dentro deste género bacteriano, mas também devido à limitação do uso dos antibióticos como medida profilática na pecuária (Elsayed et al. 2024; Shah et. 2017). Assim, de forma a controlar as infeções por Salmonella spp. nas aves, uma das principais alternativas preventivas atualmente disponíveis é o uso de vacinas.
As vacinas são medicamentos que são desenvolvidos a partir de agentes infeciosos atenuados vivos ou inativados, neste caso de bactérias, ou de informação genética, de forma a produzir uma resposta imunológica contra a infeção, quando o ser vivo é exposto ao microrganismo (Jia et al. 2020).
No caso das vacinas inativadas contra a Salmonella na produção avícola, estas contribuem para reduzir a transmissão vertical e a frequência de contaminação dos ovos ao longo da cadeia alimentar, ao diminuir significativamente a carga bacteriana. Em contrapartida, as vacinas vivas são administradas logo após a eclosão de forma a reduzir a colonização precoce do agente patogénico no trato gastrointestinal ou inibir a colonização por outras Salmonella spp. mais virulentas. Estas vacinas conferem uma imunidade polivalente, podendo atuar contra grupos de bactérias que são comuns tanto na produção avícola como em humanos.
Em Portugal, o programa de vacinação é selecionado pelo veterinário responsável pela exploração sendo verificado posteriormente pela DGAV. No caso das vacinas vivas, estas só podem ser usadas quando o fabricante fornecer um método adequado de distinção entre estirpes de Salmonella selvagens ou de campo e estirpes vacinais e quando estiver comprovada as condições de segurança da sua utilização.
Na tabela 1 é possível encontrar um conjunto de vacinas aprovadas para utilização pela DGAV na produção avícola.
Tecnologias Emergentes na Prevenção/Controlo de Colonização por Salmonella
As tecnologias emergentes na prevenção e controlo da colonização por Salmonella spp. incluem soluções inovadoras como prebióticos e probióticos, que têm se destacado como alternativas sustentáveis e eficazes para promover a saúde avícola e garantir a segurança alimentar (Hoepers et al. 2024). Estudos indicam que a administração de microrganismos benéficos, como espécies de Lactobacillus, Bacillus subtilis e Pediococcus acidilactici, pode levar a uma competição diretamente com a Salmonella no intestino das aves, reduzindo a sua proliferação (Tabela 2). Esses probióticos promovem uma microbiota saudável, criando um ambiente menos propício para a colonização por agentes patogénicos. Além disso, os prebióticos, que são geralmente fibras alimentares que servem de alimento para as bactérias benéficas, também contribuem para o fortalecimento da microbiota intestinal, potencializando o efeito preventivo. Essa sinergia entre prebióticos e probióticos otimiza a resposta imunológica das aves, contribuindo para uma barreira natural contra infeções (Abd El-Hack et al. 2022) (…).
→ Leia este e outros artigos na especial reportagem sobre a Avicultura na Revista Voz do Campo – edição de novembro 2024, disponível no formato impresso e digital.
Autoria: Daniela Araújo1,2,3, Manuela Amaral1 , Hugo Guedes1 , Gonçalo Almeida1,4, Carina Almeida1,2,5,6, Joana Castro1,2
1 Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária, I.P. (INIAV, I.P), Rua dos Lagidos, 4485-655 Vila do Conde, Portugal
2 Centro de Engenharia Biológica, Universidade do Minho 4710-057 Braga, Portugal
3 LABBELS – Laboratório Associado, 4710-057 Braga, Guimarães, Portugal
4 Centro de Estudos de Ciência Animal (CECA-ICETA), Laboratório Associado de Ciência Animal e Veterinária (AL4AnimalS), Universidade do Porto, 4099-002 Porto, Portugal
5 LEPABE— Laboratório de Engenharia de Processos, Ambiente, Biotecnologia e Energia, Universidade do Porto, Rua Dr. Roberto Frias, 4200-465 Porto, Portugal
6 ALiCE— Laboratório Associado para a Inovação em Engenharia Química, Universidade do Porto, Rua Dr. Roberto Frias, 4200-465 Porto, Portugal