As empresas Magos Irrigation Systems, Rivulis, Lusosem, ADP Fertilizantes e Hidrosoph apresentaram a meados de janeiro os resultados do ensaio de produção de arroz com rega gota-a-gota, em Salvaterra de Magos, perante uma centena de agricultores e técnicos. O ensaio foi realizado numa parcela de quatro hectares, propriedade do agricultor José Gaga, em Porto Senhorinho, na Azambuja.Coube a Hélder Esménio, presidente da Câmara Municipal de Salvaterra de Magos, abrir a sessão de boas-vindas. Para o autarca este projeto é um exemplo claro de como enfrentar os desafios globais relacionados com a escassez de água. “Todos sabemos que temos um problema que tem a ver com matéria-prima, e um deles é seguramente a água. Este não é apenas um projeto de investigação teórica, mas uma iniciativa aplicada, em culturas concretas, características e condicionantes reais”.

Esta abordagem prática confere credibilidade ao projeto e gera expetativas de avanços significativos no setor. “Isso cria a expectativa de que vamos conseguir, de facto, com este estudo, dar passos em diante e evoluir”. O autarca enalteceu ainda o papel das parcerias no sucesso do projeto. “É um conjunto de empresas que se juntaram para desenvolver este projeto, e isso diz muito da importância e do sucesso que provavelmente este projeto terá. É o trabalho de equipa, uma visão de futuro, investigação e investigação aplicada”, destaca, aproveitando a ocasião para parabenizar a Magos IS, sediada no concelho, pelo papel de liderança e inovação.

Já João Dotti, CEO da Magos IS, começou por agradecer às entidades que colaboraram nesta jornada, “sem eles, não era possível termos feito mais uma vez este ensaio”, afirma, destacando a relevância de contar com um agricultor de referência, José Gaga, que foi, simultaneamente, parceiro e executor do ensaio. Segundo João Dotti, o objetivo principal do ensaio era demonstrar que é possível produzir arroz fora do contexto tradicional, adaptando a cultura a outras terras e rotações agrícolas.
Este foi o terceiro ano de realização deste tipo de ensaio, e, como destaca João Dotti, houve ajustes importantes ao longo do tempo para aperfeiçoar as práticas e os resultados. “Estamos muito contentes com os resultados que estamos a desenvolver”, sublinha, reforçando o compromisso da Magos em contribuir para uma agricultura mais eficiente e sustentável.
Perante os desafios significativos que a agricultura enfrenta como a escassez de água, o aumento dos custos de produção e a dificuldade crescente no controlo de infestantes, especialmente na cultura do arroz, para João Paulino, em representação da Magos pelo ensaio, “o arroz não é exceção a estas problemáticas”, revela também, explicando que a monocultura e a redução da eficácia das substâncias ativas disponíveis no mercado dificultam a manutenção da produtividade. Por isso, reforçou a necessidade de se continuar a investigar e procurar soluções que combinem inovação, cooperação e eficiência para uma agricultura mais sustentável.

João Paulino recorda que o projeto, iniciado em 2022, partiu da necessidade de avaliar a viabilidade de produzir arroz com rega gota-a-gota, reduzindo o uso de água e adaptando a cultura a terrenos não tradicionais. “Começámos com o objetivo de perceber se seria possível produzir arroz neste sistema e, se fosse possível, quanta água seria utilizada e como isso afetaria a produção”, explica
No terceiro ano de ensaio, o foco foi desafiar agricultores com sistemas de rega já existentes, adaptando-os para a produção de arroz. Assim, em 2024, o sistema foi adaptado para garantir uma melhor distribuição da água em terrenos heterogéneos. “Inicialmente usamos fitas a cada metro, mas percebemos que a melhor decisão seria ter reduzido para 75 cm, devido às irregularidades do terreno e à textura do solo”, explica João Paulino. Apesar destes desafios, os resultados mostraram que as práticas implementadas permitiram um bom desenvolvimento da cultura, com um total de 1703 metros cúbicos de água por hectare ao longo do ciclo.

Nuno Sanches, representante da Rivulis, aproveitou a oportunidade também para agradecer à Magos, uma parceira de longa data no mercado português, que se traduz em projetos inovadores e desafios como este. O representante da Rivulis fez também questão de enaltecer o papel do agricultor José Gaga, cuja disposição para inovar e adaptar práticas agrícolas foi fundamental. “Mais do que nos ajudar, foi ele que geriu a cultura, com os nossos conselhos e recomendações, mas enfrentando e resolvendo os problemas diretamente”, sublinha.
Nuno Sanches, durante a sua intervenção sublinha a importância de continuar a investir em soluções que maximizem a eficiência no uso de recursos hídricos, num contexto em que a água se torna cada vez mais escassa e com disponibilidade irregular ao longo do ano. O responsável, recorda que a Rivulis, como líder no fabrico de sistemas de rega, tem apostado em produtos como a T-Tape, uma fita de rega inovadora que contém mais de 50% de material reciclado. “Este é um produto de futuro para Portugal, alinhado com as alterações ambientais e com as exigências de uma agricultura sustentável”, destaca.
Nuno Sanches regista que, ao longo dos três anos de ensaios, a abordagem evoluiu, incluindo a realização de ensaios em terrenos inclinados e com sistemas de rotação de culturas, desafiando os métodos convencionais.
“Este ano foi particularmente importante, pois conseguimos demonstrar que o arroz pode ser incluído num programa de rotação, adaptando-se a terrenos não tradicionais (…). Hoje, mostramos que o arroz pode ser uma terceira opção viável em sistemas de rotação”, afirma.
A Lusosem, pioneira em inovação na cultura do arroz, forneceu as sementes da variedade Teti e assegurou o programa de controlo de infestantes com o herbicida pós-emergente da gama Rinskor Active, Agixa da Corteva, complementado na segunda aplicação por bentazona.
Ivo Carvalho, representante da Lusosem, afirma que a escolha da variedade de arroz utilizada nos ensaios foi estratégica. A variedade Teti foi selecionada pela sua elevada germinação e resistência a condições adversas, como variações térmicas e períodos de calor intenso. Esta escolha garantiu eficiência desde a emergência até à colheita, proporcionando segurança e rentabilidade ao produtor. A variedade além do elevado potencial produtivo apresenta resistência média a herbicidas, tolerância à acama muito elevada e características adequadas ao mercado e à indústria.

Ivo Carvalho salienta que a Lusosem tem desempenhado um papel pioneiro na introdução de práticas inovadoras na cultura do arroz, como a utilização de sementeiras diretas e enterradas em seco, que atualmente representam cerca de um terço da área de produção nacional. Essas práticas, combinadas com falsas sementeiras e uma gestão eficiente de herbicidas, têm contribuído para minimizar problemas como resistências cruzadas aos herbicidas e também a danos causados por pássaros.
Para o técnico da Lusosem, este sistema de rega gota-a-gota é ideal para áreas com sistemas de rega já instalados e pode ser uma alternativa viável para introduzir a cultura do arroz em regiões onde ela não é tradicionalmente cultivada. “Com a falta de substâncias ativas, a rotação de culturas e a introdução de novas práticas culturais traz benefícios, para se produzir com uma gestão integrada e sustentável promovendo uma melhor gestão de infestantes assim como pragas e doenças”.
Segundo Filipa Setas, responsável pelo Departamento de Desenvolvimento, Marketing e Comunicação: “A Lusosem, apostada na valorização da produção nacional, e consciente que os arrozais são ecossistemas complexos em que se tem de gerir diversas variáveis, aposta num investimento contínuo no conhecimento e promoção de práticas agrícolas eficientes e sustentáveis, sendo que as tomadas de decisões no terreno passam obrigatoriamente por uma abordagem integrada dos desafios e práticas a implementar sempre contemplando aspetos económicos, mas também de gestão e preservação dos recursos naturais, o que implica um trabalho continuado e permanente junto da produção e da fileira”.
A fertilização da cultura foi assegurada pela ADP Fertilizantes, com a gama Fertiberia TECH, com a aplicação do adubo Nergetic C-PRO, antes da sementeira, e com o adubo líquido Nutrifluid IMPULSE POWER e o biofertilizante fixador de azoto Neoforce N Fixer, aplicados em cobertura.
Inês França, da ADP Fertilizantes, explicou que, no cultivo do arroz tradicional, o modelo de fertilização mantém-se relativamente constante, dado o uso predominante de produtos sólidos em adubação de fundo. Neste sistema de rega gota- -a-gota trouxe um novo desafio: adaptar a fertilização a um modelo mais eficiente.

Para a adubação inicial, foi utilizado o Nergetic C-Pro 20-8- 10, um adubo sólido com a tecnologia C-PRO, que consiste num regulador de lixiviação para garantir maior persistência dos nutrientes no solo. A dose aplicada foi de 400 kg por hectare, uma quantidade acima da média habitual. A ADP integrou no projeto a solução IMPULSE POWER, que integra a linha de adubos líquidos NUTRIFLUID IMPULSE, com tecnologia eON, que proporciona maior persistência e disponibilidade de nutrientes na zona húmida do solo. Essa escolha foi feita para garantir uma eficiência superior no sistema de fertirrigação e potenciar ao máximo a absorção de nutrientes pela cultura
“Precisávamos de produtos que nos dessem uma persistência diferente. A adubação líquida já é, por norma, mais eficiente, mas neste caso precisávamos de maior presença de nutrientes na zona húmida, e os nossos líquidos com tecnologia associada permitiram precisamente isso”, considera. Outro dos destaques apontados por Inês França, foi o biofertilizante NEOFORCE N FIXER, baseado em três microrganismos fixadores de azoto, que funcionam tanto na folha como no solo.
“Neste sistema de gota-a-gota, conseguimos tirar partido de ambos. Na cultura convencional, trabalhamos mais ao nível da folha (…) aqui fazia todo o sentido introduzirmos um biofertilizante que otimizasse toda a parte azotada”, partilha.

Joana Fonseca, da Hidrosoph, destacou a importância e o potencial do sistema de rega gota a gota, afirmando que a empresa aposta fortemente nessa tecnologia como o futuro da agricultura sustentável. “Acreditamos que esta forma de rega gota-a-gota possa ser o futuro dos nossos próximos anos”, evidencia.
Fundada em 2011, a Hidrosoph segundo Joana Fonseca, é líder em soluções de gestão de rega, operando atualmente em 11 países. A empresa desenvolveu uma plataforma própria, que integra dados do campo, como informações meteorológicas, do solo e das culturas, para auxiliar os agricultores na tomada de decisões.
“Criámos a nossa aplicação, IRRISTRAT, para responder a perguntas simples, mas fundamentais: quando, quanto, como e onde regar?”, detalha. Com acesso remoto via computador ou telemóvel, a ferramenta permite uma gestão global, acrescentando valor ao produto final ao respeitar as necessidades da planta.
Assim, no ensaio foram colocadas sondas de monitoramento de humidade, instaladas estrategicamente a 30 centímetros das fitas de rega, para avaliar a eficiência do sistema. “Temos que garantir que há uma quantidade de água suficiente para manter a cultura em conforto hídrico até a fase final”, argumenta Joana Fonseca. Isso exige monitoramento contínuo da capacidade do solo, ajustando o fornecimento de água conforme a evapotranspiração e as previsões meteorológicas. Para além disso, a utilização de imagens diárias de NDVI permitiu avaliar o vigor da cultura. “Para nós, não importa se tem mais ou menos verde ou encarnado, mas sim os números que a estatística nos dá. Analisamos se a cultura está dentro dos padrões ótimos de crescimento e, se necessário, atuamos de forma rápida para corrigir qualquer problema”, explica ainda.
Joana Fonseca reforçou que o uso de tecnologia avançada traduz-se diretamente em aumento de produtividade e eficiência no uso de recursos: “A importância de termos registos é que tomamos decisões baseadas em números. Podemos conduzir a cultura de forma diferente e garantir que, no final, isso se traduza em produção”.
Resultados:
→ O consórcio revelou que obteve 5852 kg de arroz por hectare, com 71% de rendimento industrial. A sementeira do arroz, um carolino da variedade Teti (Lusosem), decorreu a 4 de junho e a ceifa a 7 de novembro. O consumo médio de água de rega foi de 8703 L/hectare.
→ Este ensaio demonstra que a rega gota-a-gota viabiliza a produção de arroz em terrenos convencionais, sem necessidade de nivelamento, abrindo a possibilidade de integrar o arroz numa rotação com outras culturas regadas por gota-a-gota, entre as quais, o tomate para indústria, o milho ou outras anuais.
→ Esta nova forma de produzir arroz permite uma gestão mais eficiente da água, ajustando a dotação de rega às necessidades reais da cultura; e uma gestão mais eficaz do controlo das infestantes, devido a uma maior flexibilidade nas soluções herbicidas e na sua aplicação; e aumenta a flexibilidade da aplicação dos fertilizantes, melhorando a repartição dos nutrientes ao longo do ciclo da cultura, com menos perdas e menor impacto ambiental.
→ A fita de rega utilizada foi a T-Tape 508 de 16 mm, do fabricante Rivulis, instalada com 1 m de distância entre linhas de rega, espaçamento de 30 cm entre gotejadores e débito de 1L água/hora. Num futuro ensaio, nas mesmas condições, o consórcio pondera optar por uma distância de 75 cm entre linhas de rega e 40 cm entre gotejadores.
→ O arroz foi instalado por sementeira enterrada e o delineamento do ensaio foi adaptado ao sistema de rega existente na parcela, aproveitando-se todo o sistema de bombagem e filtragem. A manga de rega plana em PVC flexível, modelo Monoflaf L, foi disponibilizada pelo fabricante Heliflex.
Relato na primeira pessoa

“A cultura ficou um pouco aquém do que eu esperava a nível de produtividade. Houve alguns fatores que contribuíram para isso como a data tardia da sementeira e também ao espaçamento da fita que tem de ficar a 75 cm e 40 cm entre gotejadores (…). Se fizermos o ensaio mais algum ano já temos ideias para melhorar os resultados. É mais uma cultura que podemos fazer, mas tudo dependerá dos preços”.
Tome nota: Este é o terceiro ano de ensaios de produção de arroz com rega gota-a-gota no Ribatejo e o consórcio de empresas pretende continuar os ensaios em 2025.
Assista à vídeo-reportagem:
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