Em dezembro passado, uma delegação portuguesa visitou as instalações da CONTARINA, uma empresa dedicada ao tratamento de resíduos orgânicos – com um sistema inovador de gestão de resíduos implementado na região de Treviso (Itália), cujo objetivo é obter composto de alta qualidade, um fertilizante natural para a agricultura, que devolve os nutrientes orgânicos ao solo e melhora a sua estrutura, fechando assim o círculo natural. A Voz do Campo também fez parte da comitiva a convite da Novamont – Empresa de Versalis (Eni).

Participantes que visitaram as instalações da CONTARINA, com sede na região de Treviso – Itália

A CONTARINA opera em 49 municípios da região de Treviso, abrangendo uma das maiores cidades da área. Durante a visita, Marco Matiello, International Relations Manager e Project Manager da CONTARINA S.p.A., partilhou o modelo de gestão de resíduos implementado pela sua organização na região de Treviso, Itália. Segundo o responsável, o modelo de gestão da empresa distingue-se pela adoção de um sistema de recolha porta a porta, combinado com um modelo de pagamento baseado em prémios. Este método, altamente eficiente, foi determinante para que Treviso alcançasse uma impressionante taxa de reciclagem de 90%.

Marco Matiello, International Relations Manager e Project Manager da CONTARINA S.p.A.

“Estamos a mostrar como o nosso sistema de gestão de resíduos funciona, baseado na recolha porta a porta e pago com um troféu. Este modelo melhora a qualidade dos resíduos na reciclagem e responsabiliza os cidadãos pela separação correta em casa”, explicou à nossa reportagem Marco Matiello.

Uma das características mais marcantes do modelo é o foco na responsabilização individual dos cidadãos. Cada residência dispõe de contentores próprios para a separação dos resíduos, eliminando o uso de contentores convencionais de rua. Esta abordagem promove a responsabilidade direta pelo que é descartado, incentivando uma separação mais rigorosa e consciente dos resíduos.

Marco Matiello destaca ainda a importância da educação ambiental como um dos pilares do sistema: “Informar e ensinar os cidadãos como lidar com o seu lixo é o ponto mais importante.

Começamos pelas escolas – desde os 6 anos até aos 18. Temos 31 módulos de aprendizagem que ajudam as crianças a ensinar também aos pais quando chegam a casa”, partilha. Além das atividades nas escolas, a CONTARINA aposta em diversas estratégias de comunicação, incluindo os Eco Calendários, com datas de recolha e orientações de separação; campanhas em redes sociais; bem como sessões de formação contínua para a população em geral.

O modelo adotado pela CONTARINA não apenas levou Treviso a um patamar elevado de reciclagem, como também estabeleceu um exemplo para outras cidades e regiões em Itália e Europa. “A principal razão para o nosso sucesso é que damos responsabilidades aos cidadãos”, frisa Marco Matiello.

O trabalho conjunto da CONTARINA e Novamont

Christian Garaffa, Marketing Manager para Source Separation & Recycling na Novamont, explica o papel crucial que a empresa desempenha neste processo, desde a criação de soluções biodegradáveis até ao suporte técnico para municípios. A gestão diferenciada de resíduos orgânicos começou em Itália nos anos 90, impulsionada por municípios pioneiros. A Novamont, desde então, tem colaborado para o desenvolvimento de sistemas eficientes de recolha seletiva. Este esforço visa desviar resíduos orgânicos dos aterros para a produção de compostos agrícolas de alta qualidade, reduzindo o impacto ambiental.

“Estamos a trabalhar não só em Itália, mas também em outros países para promover o desvio de biorresíduos para terrenos agrícolas na forma de composto”, destaca Christian Garaffa. A integração dos sacos compostáveis no sistema de recolha seletiva aumenta a eficiência do tratamento de resíduos e melhora a qualidade do composto produzido.

A Novamont tem colaborado com a CONTARINA para criar ferramentas de estudo, que permitem a técnicos, políticos e outros tomadores de decisão compreender diretamente o funcionamento do sistema de gestão de biorresíduos. “A CONTARINA é exemplar em comunicar com as famílias e motivá-las a participar”, considera Christian Garaffa.

TESTEMUNHOS:

  • Silvex

Carlos Rodrigues, Gestor de Área de Negócio da Silvex, fez parte da delegação portuguesa que visitou a CONTARINA. À nossa reportagem Carlos Rodrigues realça a longa parceria da Silvex com a Novamont, que já dura há 20 anos. “Nós somos mais do que clientes, somos parceiros em diversos projetos, especialmente na compostagem”, afirma, argumentando ao mesmo tempo a importância da visita a Treviso: “Mostrar a vários stakeholders que a compostagem dos resíduos orgânicos utilizando sacos certificados como compostáveis é mais do que uma necessidade, é quase uma obrigação para que o processo resulte”.

“Colocar resíduos orgânicos num balde sem saco causa repulsa a muitas pessoas. Por isso, mostramos em Treviso que o sistema funciona e que o composto final é de excelente qualidade”, sublinha Carlos Rodrigues.

Quanto aos desafios que se colocam a Portugal, o Gestor da Silvex salienta que ainda há um longo caminho a percorrer para desenvolver um sistema de recolha e tratamento de biorresíduos aplicável em todo o território, e que existe uma falta de informação e de sensibilização para os seus benefícios. “O que falta em Portugal é adaptar os métodos de compostagem à nova realidade e reconhecer a necessidade de utilizarmos sacos biodegradáveis e compostáveis”, declara. Carlos Rodrigues acredita que esse ajuste é fundamental para alcançar resultados semelhantes aos observados em Itália.

A Silvex tem investido na produção de sacos biodegradáveis sempre certificados como compostáveis, tanto para ambiente doméstico como industrial, para a recolha de resíduos orgânicos. Recorde-se que, a Silvex produziu o primeiro saco biodegradável em Portugal em 2006.

Sacos Biodegradáveis Mater-Bi

Michele Pognani, Organic Recycling Manager da Novamont, destacou a importância dos sacos compostáveis Mater-Bi como uma ferramenta essencial para a gestão eficiente da fração orgânica da recolha seletiva.

“O material de que o saco é feito é compostável, tal como os resíduos orgânicos que contém”, explica Michele Pognani. Isso significa que, nas estações de tratamento de resíduos orgânicos, como compostagem ou digestão aeróbica, os sacos compostáveis são transformados em composto junto com o restante dos resíduos, evitando desperdícios e melhorando a eficiência do processo.

Ao contrário dos sacos de plástico tradicionais, que geram resíduos adicionais, os sacos compostáveis garantem uma recolha seletiva mais limpa e eficiente.

“Um resíduo de boa qualidade é aquele que não contém material não compostável, como plástico tradicional, vidro ou metal”, reforça ainda Michele Pognani. Os sacos compostáveis Mater-Bi, ao eliminarem a presença de materiais não compostáveis, tornam possível uma recolha de qualidade superior, resultando num composto final de alto valor. “Uma recolha com material compostável é uma recolha de qualidade, porque pode ser transformada em composto sem qualquer problema”, remata.


  • ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável

Já a Zero – Associação Sistema Terrestre Sustentável, esteve representada por Ismael Casotti, Vogal da Direção e Policy Officer. De acordo com o responsável, Portugal vive um momento de transição na gestão de resíduos. O país conta com novos planos e regulamentações, como o Regime Geral de Gestão de Resíduos e os Planos de Ação Municipais, que estão em fase de aprovação. No entanto, a grande questão é transformar estas estratégias em realidade. Nesse sentido, diz Ismael Casotti, “a ZERO faz, ou tenta, olhar para projetos que já existem, de boas práticas para mostrar que estas práticas são possíveis também em Portugal, procurando formas de as implementar”. O trabalho conjunto entre a ZERO e a Novamont tem permitido desempenhar um papel de facilitador, promovendo o diálogo entre entidades públicas e privadas, conectando a procura e a oferta na gestão de biorresíduos.

Portugal enfrenta o desafio de evitar que grandes quantidades de biorresíduos acabem em aterros.

Ismael Casotti destaca a necessidade de direcionar este material para fins mais nobres, como a produção de composto para a agricultura e a melhoria da qualidade dos solos. “Temos de garantir que os biorresíduos não sejam desperdiçados e que contribuam para gerar benefícios ambientais e económicos”, termina.


  • Novamont Iberia

Rosa Puig, Marketing Manager da Novamont Iberia, sublinha a importância desta visita à CONTARINA, como forma de conhecer em primeira mão o sistema e os resultados obtidos com este modelo exemplar, para poder aproveitar esta experiência de mais de 20 anos para apoiar o desenvolvimento da gestão de biorresíduos em Portugal. Como em outras ocasiões, a Novamont Iberia “acredita que é fundamental pôr em contacto territórios com anos de experiência na gestão de biorresíduos, como a Itália ou algumas regiões de Espanha, nomeadamente Catalunha e País Basco, ou até a Dinamarca, com territórios que estão a começar a implementar o sistema de gestão de biorresíduos”, refere Rosa Puig. Acrescenta que Portugal pode aproveitar este conhecimento e ativar em todo o seu território em conjunto com a Novamont Iberia e entidades e empresas do setor, políticas que promovam uma gestão e tratamento eficiente dos resíduos, em linha com os objetivos estabelecidos pelos regulamentos europeus sobre economia circular e sustentabilidade. Acompanhar a delegação portuguesa, para Rosa Puig, foi muito gratificante e viu que o interesse está no auge, “é apenas uma questão de aproveitar o trabalho realizado”.

Sobre a CONTARINA:

A instalação está a funcionar desde 2001 como uma unidade de compostagem. Em 2018, foi submetida a uma profunda modernização e ampliação para tratar 73 000 toneladas de resíduos por ano (45 000 toneladas de resíduos alimentares e 28 000 toneladas de resíduos de jardim), garantindo assim a autossuficiência na gestão da fração orgânica. Esta unidade processa os resíduos orgânicos e verdes recolhidos porta a porta nos 49 municípios de Treviso servidos pela CONTARINA. Os materiais recebidos são de excelente qualidade, com contaminantes não compostáveis que representam menos de 1% em peso, como confirmado por análises regulares.

Para além de aumentar a capacidade da fábrica, as atualizações de 2018 visaram também reduzir o impacto ambiental, minimizar os odores desagradáveis e melhorar o processo de compostagem para produzir composto de qualidade ainda mais elevado. Atualmente, todo o composto produzido está certificado para utilização na agricultura biológica e é utilizado por várias empresas agrícolas locais para cultivar produtos de qualidade superior.

→ Leia este e outros artigos publicados na edição de fevereiro 2025 da Revista Voz do Campo.

 

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