Segundo a FAO, nos últimos 40 anos, o mundo perdeu um terço dos seus solos aráveis, o equivalente a 430 milhões de hectares, enquanto na Europa, especificamente, 70% dos solos apresentam um nível de degradação grave ou moderadamente grave devido à contaminação, compactação, erosão ou perda de matéria orgânica.

Neste contexto, a Agricultura de Conservação surge como um sistema que procura evitar estas perdas, ao mesmo tempo que regenera os solos degradados. Entre outros aspetos, este sistema procura:

Promover a mínima perturbação mecânica do solo (zero mobilização).
Aumentar a biodiversidade e os processos biológicos naturais acima e abaixo da superfície do solo.
Contribuir para uma maior eficiência na utilização da água e dos nutrientes e para uma produção agrícola melhorada e sustentada.
Manter a cobertura permanente do solo e a diversificação das espécies vegetais.

Assim, em relação a este último ponto, a opção de implementar coberturas de solo em terrenos agrícolas produtivos surge como uma ferramenta que procura preservar e promover as propriedades físicas, químicas e biológicas do solo, estimular a biodiversidade dos sistemas agrícolas e evitar perdas económicas através da melhoria dos fatores e condições nutricionais das culturas.

O que são culturas de cobertura?

As culturas de cobertura são culturas plantadas ou a manutenção da vegetação natural que têm como objetivo fornecer cobertura ao solo.

Estas culturas (plantadas ou naturais), quando cortadas e mantidas in situ, permitem a reciclagem de nutrientes e evitam perdas de nutrientes se não forem utilizadas pelas culturas. No caso da sementeira artificial, são preferidas espécies que atinjam objetivos específicos, como o fornecimento de matéria orgânica e o sequestro de dióxido de carbono atmosférico através da geração de grandes quantidades de biomassa (gramíneas), espécies que forneçam azoto através da fixação atmosférica (leguminosas) para ser utilizado posteriormente pela cultura principal, ou culturas que melhorem as condições físicas do solo, contribuindo para a sua descompactação (brássicas).

Benefícios das coberturas vegetais:

1 – Fixação do azoto atmosférico
As leguminosas fixam o N atmosférico (N2 ) através da simbiose bacteriana nas raízes com o género Rhizobium. Estima-se que 40-60% da fixação de N esteja disponível após a incorporação da cultura de cobertura. Assim, as estimativas de fixação anual atingem os valores apresentados na Tabela 1.

2 – Incorporação de matéria orgânica
A biomassa gerada pela cultura de cobertura aumenta a matéria orgânica uma vez incorporada no solo. Os valores estimados para algumas espécies são apresentados na Tabela 1.

Tabela 1. Fixação anual de azoto por hectare e produção de biomassa de diferentes culturas de cobertura (adaptado de Campillo, 2003 e Espinoza, 2006).

3 – Controlo de ervas daninhas
De acordo com a investigação de 2018 de Tursus et al. “Use of living, mowed and sois-incorporated cover crops for weed control in apricot orchards”, onde foi avaliado o efeito de diferentes culturas de cobertura no controlo de ervas daninhas num pomar de damasco, as culturas de cobertura tiveram um efeito positivo no controlo de ervas daninhas. No estudo, concluiu-se que a incorporação de culturas de cobertura no solo foi útil na supressão de ervas daninhas e foi capaz de proporcionar um melhor controlo de ervas daninhas do que a aplicação de glifosato ou o controlo mecânico (Figura 1).

4 – Proteção contra a erosão
Quando não há culturas de cobertura, o escoamento superficial aumenta, promovendo a perda de solo e de nutrientes, principalmente de fósforo que, devido à sua limitada mobilidade no solo, está presente sobretudo nos primeiros centímetros do solo.

A folhagem das culturas de cobertura reduz a velocidade das gotas de chuva antes de atingirem a superfície do solo, impedindo a desintegração dos agregados do solo e a impermeabilização da superfície do solo.

Por sua vez, as raízes das culturas de cobertura unem as partículas do solo, melhorando a estrutura do solo e a infiltração da água. Por sua vez, o material cortado que permanece na superfície reduz a evaporação direta do solo.

De um ponto de vista prático de gestão, as culturas de cobertura melhoram o acesso às culturas no inverno e na primavera, removendo o excesso de água (através da percolação, melhorando a porosidade do solo, ou através da evapotranspiração da própria cultura de cobertura), proporcionando assim uma superfície firme para as operações das máquinas agrícolas.

5 – Retenção de nutrientes
Seja por substituição morfológica ou por efeitos de pH, entre outras razões, o solo tem uma carga elétrica líquida maioritariamente negativa. Funciona como um “íman” que fixa catiões (Ca+², Mg+², K+, NH4+, entre os principais).

Se as condições forem propícias à erosão, as partículas do solo são arrastadas e os nutrientes são perdidos, especialmente aqueles que são fortemente retidos no solo (K, P, Mg, Ca).

A planta coberta absorve inicialmente os nutrientes e incorpora-os no seu metabolismo. Uma vez colhida a cultura, estes são incorporados no solo e iniciam o seu processo de decomposição, onde são mineralizados por microrganismos, deixando os nutrientes lentamente disponíveis para a cultura principal.

Este “sequestro” evita que os nutrientes se percam através de processos como a volatilização, a lixiviação ou a erosão (…).

→ Leia o artigo completo na Revista Voz do Campo edição de outubro 2024, disponível no formato digital e impresso.