Portugal vai, de novo, a eleições legislativas em maio. A AJAP – Associação dos Jovens Agricultores de Portugal alerta para a necessidade de intensificar o apoio aos Jovens Agricultores (JA), a importância de iniciar a execução da Estratégia ‘Água que Une’, vital ao País, e não menos urgente, o combate às assimetrias rural/urbano, pela promoção de uma verdadeira coesão territorial, onde os Jovens Empresários Rurais (JER) são essenciais no combate à desertificação cada vez mais acentuada.
As medidas colocadas à disposição dos agricultores, ao longo dos quadros comunitários de apoio, têm contribuído para o crescimento e modernização dos modelos de agricultura mais competitivos, para o aumento da qualidade dos produtos e segurança alimentar, para a maior sustentabilidade e racionalidade no uso dos fatores de produção, mas também para o aumento das exportações destas explorações, que sem tem refletido nos números nacionais da nossa agricultura. São números que nos orgulham é certo, mas mascaram a diminuição do peso das pequenas e médias explorações, contribuem para o abandono de muitas, tornando-as, obviamente, mais expostas a incêndios, conduzindo à ausência de rejuvenescimento, e mesmo nas explorações mais competitivas fica muito aquém do necessário. Temos de ter consciência que estes resultados são atingidos em áreas limitadas no País, reportando-se a pouco mais de 15% a 20% do território.Importa ter presente que a centralidade das medidas, e a sua aplicação em igualdade de circunstâncias em todas as regiões, apesar da existência de diferenciação pela aplicação da Valia Global da Operação (VGO), têm por vezes impactos mais positivos em determinadas regiões, e obviamente menos positivos, e quase sem aplicabilidade noutras.
É porventura difícil, fazer muito melhor, embora Portugal não sendo regionalizado, é descentralizado, e seria extremamente importante que essa descentralização fosse garantida, pelo menos parcialmente, em estratégias e numa gestão de fundos de nível regional, que atenda às particularidades e responda mais eficazmente às necessidades e desafios das várias agriculturas/territórios. Na prática, contribuindo para uma mais efetiva aplicação do princípio da subsidiariedade. A pontuação dos projetos pela aplicação das VGO’s, em todo o País, impede que muitos agricultores, em inúmeras regiões, vejam as suas candidaturas aprovadas. Se continuarmos apenas a priorizar e valorizar alguns, com base em modelos centralizados, aumentamos o fosso, desde logo entre sequeiro e regadio, e entre muitas regiões tão díspares pela qualidade dos solos, topografias, declives e dimensão média das parcelas. Essas regiões mais desfavorecidas, de montanha, também denominados territórios de baixa densidade e vulneráveis, podem conciliar agricultura, pecuária, florestas e transformação, podem criar modelos de comercialização mais ajustados (Agrupamentos de Produtores Multiprodutos, por exemplo), podem organizar-se nas suas associações e cooperativas para poderem usufruir de tecnologias conjuntas, entre outras oportunidades de grande mérito. Em suma, podiam ter resultados muito melhores, se existissem apoios com maior diferenciação, ou então pela abertura de avisos específicos. Elencamos de seguida algumas medidas que consideramos urgentes e primordiais à solidez do setor e à aposta contínua nos Jovens Agricultores Portugueses.
Reforçar o prémio de primeira instalação
A aposta nos JA por parte deste Governo e os discursos à volta do rejuvenescimento foram e são sinais importantes para o setor nos últimos meses. É relevante o prémio que, no limite máximo, pode chegar aos 55 000€ (jovens em regime de exclusividade e pertencer a uma zona vulnerável), 50 000€ (jovens em regime de exclusividade) e 25 000€ (Base para JA). Estamos certos de que vai existir uma boa adesão de jovens. No entanto, em relação aos valores do prémio máximo, percecionamos que a adesão venha a ser menor, em virtude de o país agrícola ser muito heterogéneo e para muitas regiões os JA tenham dificuldade em conseguir singrar nas suas ambições enquanto agricultor, apenas com a rentabilidade da exploração, pelo menos nos primeiros cinco anos.
Esperemos que os cortes que todos contestámos (3ª reprogramação do PEPAC), no caso do investimento, possam ser reforçados por forma a que não faltem meios para os investimentos considerados mais prioritários, na modernização das explorações, e na necessidade urgente de instalar mais JA. Relativamente ao valor do prémio de instalação, a AJAP defende a existência de um escalão intermédio, e em todos eles o acréscimo para as zonas vulneráveis, sugerindo-se os seguintes escalões:
- Base 25 000€ + em território vulnerável (+5 000€);
- Base intermédia 35 000€ com 50% do rendimento proveniente da própria exploração + em território vulnerável (+5 000€);
- 45 000€ base exclusividade, com 100% do rendimento proveniente da própria exploração + em território vulnerável (+ 5 000€).
A introdução de uma modalidade intermédia permite valorizar um grupo de jovens, que tendencialmente podem fazer evoluir a sua exploração para a exclusividade total na agricultura, mas na fase de instalação e durante ainda os primeiros anos de atividade, o facto de poderem ter outras receitas, permite-lhes fazer face a compromissos com os capitais próprios necessários aos investimentos, inclusive para o pagamento do arrendamento de terra, ou até para a compra de mais área.
Ambição: aumentar o número de Jovens Agricultores a instalar
Recordamos que a média da idade da população agrícola em Portugal é de 65 anos para agricultores singulares[1], Portugal é o segundo país da Europa com o percentual mais baixo de rejuvenescimento do setor, sendo que apenas o Chipre consegue ser pior.
Por forma a instalar mais JA, para além das medidas de apoio, tem de ser garantido um ecossistema mais favorável ao empreendedorismo jovem, com políticas que simplifiquem a instalação, promovam a formação técnica e empresarial, facilitem o acesso à inovação e tecnologias em face dos grandes desafios atuais e futuros modelos, nomeadamente agricultura de precisão e digitalização, práticas regenerativas, biotecnologia, incluindo luta biológica contra inimigos das culturas, economia circular e bioenergia).
Existem ainda outras dificuldades, que vêm sendo crónicas ao longo de décadas, na fixação das novas gerações a este setor, desde logo, o acesso à terra e ao crédito que continuam a ser um enorme entrave. Não podemos esquecer que enquanto não se agilizar a logística associada a todo o processo, como a elaboração e aprovação do projeto, os formulários, as interpretações da legislação (por exemplo, a constituição das sociedades com JA e restantes gerentes), para não falar do que os espera com as oscilações de mercado, a falta de mão de obra e o capital próprio para fazer face ao investimento, e aos primeiros anos de pequenas receitas. A lógica dos três A(s) prevalece, ou seja, o setor é pouco Atrativo, de difícil Acesso e ainda com demasiados Atritos, para captar jovens. Não podemos desistir de, paulatinamente, ir atenuando as dificuldades, mas também temos de ter ambição, e para a AJAP a ambição do PEPAC em relação ao número de jovens a instalar (2.061), é manifestamente baixa para o nível de rejuvenescimento em que o setor se encontra. Em nossa opinião, a aposta nos JA carece de mais meios para que, de norte a sul, se possam instalar um número aceitável de jovens, sendo que o PEPAC devia fazer desta medida uma bandeira. No entender da AJAP, devíamos instalar pelo menos 2500 Jovens Agricultores até ao final do programa.
Apoio Técnico Especializado
O Apoio Técnico Especializado aos Jovens Agricultores é uma reivindicação mesmo muito antiga da AJAP, e tendo sido já anunciada, é uma falha que ainda não esteja em vigor. Entre outros fatores, anteriormente identificados, o apoio técnico especializado é crítico, identificado em todos os estudos da AJAP, em estudos Académicos, outros realizados pelos Serviços do Ministério da Agricultura, e muitos que envolvem várias instituições.
Apesar de existir muito desânimo no terreno, estamos convictos que esta medida vai ter sucesso, se a sua implementação estiver associada às organizações do setor. E se o Ministério da Agricultura comprometer as organizações de cúpula e as suas associadas e protocoladas. Trata-se de um autêntico “exército” de técnicos que cobre todo o país agrícola e rural, ao serviço dos agricultores, produtores pecuários e florestais, prestando ainda apoio nas áreas da transformação, promoção das produções e na comercialização das produções dos agricultores. Compete aos organismos do Ministério definir as regras e monitorizar a ação das organizações e dos seus técnicos. Neste âmbito é fundamental a partilha de mais formação e informação, através da plataforma Akis Portugal (sistema de conhecimento e inovação da agricultura), da qual as organizações fazem parte.
As prioridades de hoje são cruciais para o futuro! Nesse sentido, o acompanhamento técnico reveste-se de primordial importância conducente à atenuação dos efeitos das alterações climáticas, promoção da sustentabilidade e de uma gestão eficiente dos recursos naturais como a água, solo e o ar, bem como contribuir para travar e inverter a perda de biodiversidade, melhorar ecossistemas e preservar os habitats e as paisagens.
Capitais Próprios/ Financiamento/Terra/Seguros
Percebemos a dificuldade de existirem apoios em duplicação na União Europeia, os JA com projetos aprovados financiados (prémio e apoios percentuais a fundo perdido aos investimentos) não podem ser beneficiários de um sistema de apoio com taxas de juro bonificadas para colmatar a necessidade de possuírem capitais próprios. Certo é que o problema existe, pois no investimento dos JA, com taxas de apoio a fundo perdido de 50 ou 60%, o pagamento desse percentual, apenas é efetuado após a apresentação real dos comprovativos de pagamento na totalidade dos investimentos realizados, e por esse motivo é imprescindível que o JA tenha um bom fundo de maneio.
Conscientes de que este é, muitas vezes, um enorme problema e uma limitação o recurso ao crédito bancário, a verdade é que pode ser a única solução, que nem sempre é de fácil obtenção. Além disso, quando o projeto é aprovado em terrenos arrendados, ou em comodato, nem a terra pode servir de garantia.
O Ministério da Agricultura, tendo presente este problema, tem feito alguns esforços para a sua resolução, mas para os JA este esforço deveria existir em contínuo. Neste contexto, apelamos que esse esforço por parte do Governo, seja feito junto do Banco Europeu de Investimento (BEI), articulado com a Banca Nacional, ou com a Banca mais associada ao Estado (Banco de Fomento ou Caixa Geral de Depósitos).
É necessário criar para a agricultura linhas de financiamento bancário específicas, reforçando as direcionadas aos JA(s), por forma a poder diminuir o mais possível, esta limitação temporal, dos agricultores com projetos viáveis, em que por vezes a inexistência de capitais próprios e fundos de maneio suficientes, conduzem à desistência de “sonhos” com os pés assentes na terra.
Estas linhas deveriam comportar várias possibilidades para todo o setor, onde a base (variável para cada medida), deveria assentar em juros bonificados, períodos de carência ajustados a cada realidade e prazos de pagamento alargados no tempo, onde no limite máximo temporal devia estar associado à compra de terra, propomos 20 anos. Aliás, a compra de terra, tão determinante, deveria estar inserida nas linhas de financiamento ao setor, associadas à bonificação das taxas de juro. É ainda entendimento da AJAP que os conceitos trabalhados com algum sucesso em anos anteriores, nomeadamente a Bolsa de Terras e o Banco de Terras (terras do Estado, pouco implementado), deveriam ser relançados, após se proceder a algumas alterações estruturais e de operacionalização.
Quanto aos seguros de agrícolas de colheitas, criados em 1996, e como um forte instrumento de proteção e defesa contra as aleatoriedades climáticas que afetam as culturas agrícolas, necessitam de uma profunda revisão, de forma a incorporar cada vez mais agricultores, mais culturas e maior espectro de problemas associados à impressibilidade deste setor. Os números indicam que só aproximadamente 25% dos agricultores fazem seguros de colheitas, torna-se, em nosso entender, necessário rever a zonagem de risco, as tarifas de referência, as franquias, as coberturas, as bonificações, tornando o seguro mais atrativo, a preços mais convidativos, contribuindo para o equilíbrio do sistema.
‘Água que Une’: Tem mesmo de unir, e continuar!
Salientamos, no contexto deste comunicado muito dedicado aos JA e agricultores em geral, a Estratégia ´Água que Une’, apresentada este mês, pelo Governo, e que pretende melhorar a gestão dos recursos hídricos no País. Entre as medidas prevê-se o estudo e construção de novas barragens e de novos empreendimentos de fins múltiplos no País, mas também várias medidas de melhoria da eficiência do setor e a aposta na reutilização de água. A sua execução é fundamental para o País e para a agricultura, e de extrema importância para os futuros JA. Para a AJAP este investimento de 5 mil milhões de euros, nos próximos 15 anos, contempla uma visão integrada, que inclui a agricultura, a indústria, o consumo doméstico e o turismo, de norte a sul, do litoral ao interior. Todos os portugueses, direta e indiretamente, saem beneficiados com esta perspetiva da água, da sua preservação, aproveitamento e reutilização. Depois das autoestradas que uniram Portugal, e tudo ficou mais próximo, agora temos de encurtar caminhos para que o desenvolvimento chegue mais rápido, para que as diferentes atividades económicas possam ter índices mais elevados em regiões mais afastadas dos grandes centros. Com mais autoestradas para a água, mais captações superficiais e ligações entre elas, mais economia e uso eficiente podemos fazer mais com menos. E este recurso, que não devemos desperdiçar, mas que também temos de saber usar, gota por gota, em proveito das populações, dos territórios e do desenvolvimento do País.
O aumento de 30% para o regadio incluído neste Plano será determinante para garantir a resiliência hídrica do setor e capacitar os agricultores para enfrentar as carências futuras. Esperamos, sinceramente, que esta Estratégia não fique refém de ciclos políticos, e o futuro Governo, deve, em nossa opinião, usar este magnífico trabalho, e dar-lhe continuidade e a prioridade devida, até à sua execução e implementação plena.
Coesão que nos una/impulso do JER
A revitalização dos territórios rurais passa pelo rejuvenescimento das atividades existentes (agricultura e todas as outras), e pelo surgimento de novas atividades associadas à tecnologia, inovação e à digitalização. Torna-se premente e necessário encontrar novas sinergias, novos incentivos, melhorar e agrupar apoios existentes, bem como sensibilizar as diferentes áreas da governação para enfrentar o desafio do rejuvenescimento, da revitalização, reconversão e inovação dos sistemas produtivos, valorizando os produtos, indo ao encontro de novos clientes. A instalação e a fixação de jovens empresários rurais, nestas regiões, conduzem à criação de empresas e emprego, à diversificação da base económica regional, contrariando o progressivo despovoamento do mundo rural, o abandono dos territórios e à delapidação dos recursos naturais e do património natural e cultural.
Neste aspeto, reforçamos a necessidade de dar ímpeto à figura do JER – Jovem Empresário Rural (criada oficialmente pelo Decreto-Lei n.º 9/2019, de 18 de janeiro e Portaria n.º 143/2019, de 14 de maio), de extrema importância para o desenvolvimento do País. Apelamos a que o próximo Governo valorize e avance com esta medida, que se trata de uma figura que promove o empreendedorismo e o mundo rural, contribuindo para uma coesão unificadora do território.
Esta medida do rejuvenescimento destes territórios devia consubstanciar-se numa estratégia nacional, que articule os ministérios Coesão, Agricultura, Juventude, Economia, num desígnio “Coesão que nos Una”. As figuras do JER e do JA são imprescindíveis no desenvolvimento destes territórios e acreditamos que serão decisivas para combater a desertificação de muitas regiões do País em quase declínio absoluto.
A AJAP espera que, este período de crise política, possa servir para que os partidos reflitam sobre o que querem para o País e suas regiões, pois continuar a protagonizar desenvolvimentos assimétricos, deixar ao abandono mais de 2/3 do território, onde já não reside 1/3 da população, é ignorar as nossas raízes e continuar a deixar para trás territórios, sem atividade económica, sem jovens e sem esperança. Um dia, os nossos jovens vão perguntar onde gastámos tantos fundos para a coesão, para o desenvolvimento regional e local, se já estamos a deixar aldeias ao abandono, vilas sem vida, e cidades no interior que nem dimensão têm para vilas.
Estamos disponíveis para colaborar e ajudar a Agricultura a tornar-se mais robusta e resiliente, e os territórios rurais mais prósperos, dinâmicos e rejuvenescidos, mas continuaremos atentos, sobretudo aos problemas que carecem de resposta mais urgente!
Contem com a AJAP para fazer acontecer!
[1] Fonte: INE, 2024