Enxertia e pinheiro-bravo são duas palavras que mesmo um técnico conhecedor e experiente poderá não associar. No entanto, a mesma lógica que geralmente justifica o uso desta técnica de propagação vegetativa – para produção de fruto – aplica-se no caso da enxertia de pinheiro-bravo.
Uma planta de qualidade começa inevitavelmente com uma boa semente. Atualmente a maioria da semente é colhida em pinhais “normais”, mas existem alternativas mais interessantes para o proprietário. Apesar de pinhal e pomar também parecerem, à primeira vista, palavras desconexas a verdade é que um pinhal instalado e conduzido com o propósito de produzir semente tem precisamente a designação de pomar. A gestão de um pinhal desta natureza é necessariamente distinta, assim como a sua instalação. Apesar de, no nosso país existirem pomares de pinhal- -bravo plantados, a enxertia tem sido também utilizada. E porquê? Quando há árvores já selecionadas por um programa de melhoramento genético a enxertia permite produzir semente com ganhos genéticos conhecidos. A enxertia possibilita ainda que a colheita dessa semente comece mais cedo. Cerca de 9 anos, após a enxertia, o pomar entra em produção, enquanto, pela via da plantação pode ser necessário aguardar 15 ou mais anos.
Uma viagem ao futuro da produção de plantas
Atualmente está a decorrer um ambicioso projeto que vai mudar o panorama da disponibilidade de planta de pinheiro-bravo com ganho genético. Com o apoio do PRR, o projeto Agenda transForm irá permitir a instalação de 12 hectares de novos pomares, o que permitirá aumentar para cerca de 6 000 hectares/ano a capacidade de (re)arborização com plantas melhoradas. Como referência, atualmente essa capacidade está estimada em cerca 1 900 hectares/ano, pelo que a ambição é triplicar a capacidade de arborização com plantas melhoradas. Para alcançar este objetivo, no final de 2022 deu-se início “à caça” dos melhores locais para os futuros pomares. Em 2023 fez-se uma primeira campanha de enxertia com caráter sobretudo experimental, uma vez que ainda não estavam reunidas todas as condições operacionais. Em 2024 decorreu uma campanha de enxertia de maior escala, à medida que o projeto entra em “velocidade cruzeiro”.
Este projeto leva-nos a vários pontos do país e, neste artigo, iremos fazer uma viagem virtual, que começa com uma viagem no tempo, ao início do Programa de Melhoramento Genético do pinheiro-bravo.
Primeira paragem: Mata Nacional de Escaroupim
A enxertia de pinheiro-bravo começou na Mata Nacional de Escaroupim, situada no concelho de Salvaterra de Magos. É este local que acolhe, há dezenas de anos, ensaios relacionados com o Programa de Melhoramento Genético do pinheiro-bravo cientificamente liderado até hoje pelo INIAV. Além de vários ensaios científicos, na Mata Nacional de Escaroupim situa-se o primeiro pomar clonal de pinheiro-bravo do nosso país. Primeiro, e único até ao momento. Este pomar produz semente com um ganho genético de 21% em volume e tem fornecido semente com a categoria qualificada comercializada pelo CENASEF.
Na Mata Nacional de Escaroupim foram selecionadas, em 2024, 23 árvores para fornecerem as estacas a enxertar nos novos pomares clonais.
Segunda paragem: Serra da Malcata
Em 1994, foi instalado na Malcata um dos ensaios relacionados com o Programa de Melhoramento Genético do pinheiro-bravo. Os resultados desse ensaio permitiram selecionar 40 árvores, das quais foram recolhidas estacas para enxertar nos novos pomares clonais. Estas árvores, evidentemente, já são adultas, tal como as que se localizam em Escaroupim. Assim, a recolha dos garfos exigiu o envolvimento de profissionais com capacidade para escalar. No caso de Escaroupim, foi possível conciliar a colheita de garfos com a já rotineira recolha de pinhas. Já na Malcata foi mesmo necessário implementar uma operação exclusiva para a recolha de garfos.
Terceira Paragem: Perímetro Florestal de Alva de Pataias
Este foi um dos locais que recebeu os garfos colhidos em Escaroupim e na Malcata, transportados cuidadosamente em malas térmicas. Os cavalos geralmente são árvores com 3 a 4 anos de idade. Assim, para executar o projeto PRR no intervalo 2022-2026 procuraram-se pinhais que reunissem condições para receber os garfos já em 2023. Não foi fácil encontrar os locais adequados. Além da idade das plantas, as condições topográficas para a futura recolha da semente, a facilidade de acesso e a possibilidade de minimizar a polinização das árvores do pomar por pinheiros vizinhos foram fatores decisivos. Foi em áreas litorais geridas pelo ICNF que encontrámos a solução para este desafio (…).
→ Leia o artigo completo na Revista Voz do Campo: edição de junho 2024
Autoria: Susana Carneiro, diretora executiva
Centro PINUS