Não há falta de água em Portugal, há falta de Planeamento e Gestão da mesma, a nível nacional, regional e local, competência do Estado, associada ao bloqueio sistemático do seu uso pelas Entidades Oficiais responsáveis pelo setor.

Disponibilidades hídricas nacionais

De acordo com o Plano Nacional da Água 2015, documento da APA, o país dispõe, anualmente, de 56.000 hm3 /ano, com 8.000 hm3 /ano de águas superficiais e 48.000 hm3 /ano de águas superficiais, dos quais cerca de 1/3 vindos de Espanha. Entretanto, captam-se 4.500 hm3 /ano, dos quais cerca de 1/3 voltam ao meio hídrico, resultando em consumos totais da ordem dos 3.000 hm3 /ano, 5,3% das disponibilidades, que correspondem, então, a 19 vezes os consumos.

A longo prazo, as disponibilidades poderão reduzir-se até 30%, para 39.000 hm3 /ano, e os consumos poderão duplicar, para 6.000 hm3 /ano, e mesmo assim as disponibilidades serão 6,5 VEZES superiores aos usos.

E onde é usada a água?

Do volume total captado, cerca de 1.000 hm3 /ano correspondem a usos urbanos e industriais, dos quais perto de 4/5 retornam ao meio hídrico, o que se traduz num uso de 200 hm3 / ano, cerca de 0,4% das disponibilidades (!) Tal indica que, não havendo consumos agrícolas, como acontece nos Países do Centro e Norte da Europa, não haveria escassez de água em Portugal.

Só que o país apresenta, em grande parte do território, um clima mediterrâneo, como Espanha, Itália, Grécia e Sul de França, com os quais se pode comparar, com elevados consumos de água na rega, atividade económica de extrema importância, não só a nível económica mas também a nível social, da coesão do território, e a nível ambiental, da conservação da paisagem humanizada existente no mundo rural. Ou seja, a nível dos consumos críticos, “sem preço”, nomeadamente o consumo urbano, o país consegue responder sem qualquer problema, e já atualmente, às necessidades globais nacionais.

Só a nível dos restantes consumos inerentes às diferentes atividades económicas, nomeadamente agrícolas, o país apresenta problemas de falhas de abastecimento de água, resultantes de falta de planeamento e má gestão dos recursos hídricos, associados ao permanente bloqueio do seu uso por parte das Entidades Oficiais competentes.

Problema 1? Falta de Planeamento e Gestão

A água corre de Inverno, quando é necessária no Verão, faltando barragens de armazenamento nos locais adequados, sejam grandes, médias, pequenas ou micros!

A água corre a Norte, e é mais necessária a Sul, faltando infraestruturas de interligação entre bacias, obras que devem ser planeadas e executadas com tempo, o que não acontece, correndo-se permanentemente “atrás do prejuízo”.

Problema 2? Bloqueio pelas entidades oficiais

À exceção dos usos para consumo humano, fortemente protegidos por legislação diversa, existe um bloqueio sistemático ao uso da água, nos locais onde ela é mais precisa, por parte das Entidades Oficiais, nomeadamente a APA!

As únicas captações que passam são mesmo as charcas (que agora também “cobrem” os reservatórios …) e dentro duma série de restrições, dado ter saído legislação específica sobre o tema. Pequenas Barragens? Praticamente todas chumbadas pelas mais variadas razões.

O Setor Agrícola Nacional, incluindo a Pecuária e as Agroindústrias, tem vontade de criar novas captações superficiais (barragens, reservatórios) e subterrâneas (charcas, furos), capacidade técnica e financeira para as executar, mas os respetivos licenciamentos são permanentemente “indeferidos” pelas mais variadas razões, pela APA e seus “associados”, o ICNF e as CCDR.

Portugal tem 19 vezes mais água do que a que usa. Não há falta de água. Há falta de planeamento e de gestão, associados ao bloqueamento do seu uso.

Resultados da situação existente O resultado da não resolução dos problemas referidos são as notícias cíclicas da falta de água, nomeadamente no Sul do país, Alentejo e Algarve, bem como em todo o Interior Norte da Beira Baixa a Trás-os-Montes.

O resultado é a construção de “charcas” (na maioria dos casos Reservatórios, que recebem águas do exterior, e não charcas, poços largos construíveis em locais muito específicos) com capacidades fora do normal, preenchidas a partir de bombagem de linhas de água, com custos muito superiores aos de uma barragem com a mesma capacidade e sem recurso a bombagem. Mau para o ambiente, mau para a economia.

O resultado é a abertura de captações subterrâneas onde possível, mesmo que ilegalmente, nomeadamente no Vale do Tejo e no Algarve, fruto duma necessidade absoluta da atividade de regadio, levando à desnecessária sobre-exploração descontrolada dos aquíferos quando as águas superficiais seguem para o mar (…).

→ Leia o artigo completo na Revista Voz do Campo edição de outubro 2024, disponível no formato digital e impresso.

Autoria: Jorge Avelar Froes, Eng.º Agrónomo