Por Elsa Lamy, investigadora do Instituto Mediterrâneo para a Agricultura, Ambiente e Desenvolvimento (MED), da Universidade de Évora (UÉ).
Nunca se olhou tanto para a alimentação e para os sistemas alimentares como nos dias de hoje. A tendência de crescimento da população mundial e a urgência em considerar o impacto da cadeia alimentar no ambiente, na sustentabilidade e na saúde das populações, leva a que a nutrição humana seja uma das preocupações fundamentais da sociedade atual.
A Dieta Mediterrânica pelas suas características, pelos processos e hábitos associados é considerada uma das formas de nutrição que mais contribui para a sustentabilidade e saúde humana.
As principais características da Dieta Mediterrânica são: Azeite como principal fonte de gordura; Hortaliças e frutos em quantidade e frequência; Cereais integrais, leguminosas e oleaginosas (frutos secos) como fonte de proteína e fibra; Consumo moderado de lácteos e de peixe; Consumo esporádico de carnes vermelhas e brancas; Vinho de forma moderada e a acompanhar as refeições; Frugalidade e consumo organizado por refeições em grupo; Confeção na forma de sopas, estufados e caldeiradas, o que reduz a perda de nutrientes; Consumo sazonal dos alimentos; Recurso à produção local; Atividade física e horas de pausa e sono.
Já no que respeita aos principais benefícios para a saúde da Dieta Mediterrânica aponta-se a Qualidade de vida; Controlo do peso (prevenção de obesidade); Níveis estáveis de glicémia e de pressão arterial; Melhor qualidade de sono; Maior longevidade; Menor incidência de doenças coronárias e cardiovasculares; Menor incidência de diversos tipos de cancro.
A origem da Dieta Mediterrânica
A Dieta Mediterrânica assenta num padrão alimentar com mais de cinco mil anos, com origem na bacia do Mediterrâneo, influenciada pelas civilizações que por aí passaram, pelas suas migrações e pelas trocas de saberes.
O conceito de Dieta Mediterrânica, associado aos benefícios na saúde, foi estabelecido apenas nos anos 50, do seculo XX, em consequência dos resultados de um estudo liderado por um fisiologista norte-americano – Ancel Keys – em que se encontraram valores significativamente mais baixos de doenças coronárias e cardiovasculares em países como a Itália e a Grécia, comparativamente a países com outros regimes alimentares.
Dieta Mediterrânica e Saúde Planetária
Em 2019 surgiu o conceito de Dieta da Saúde Planetária. Tem subjacente o balanço entre o que é ótimo para o planeta e o que é ótimo em termos de alimentação e nutrição humana. É uma dieta de base vegetal, onde a proteína vegetal tem um peso superior à proteína animal, mas que mantém o consumo de carne e peixe em pequenas quantidades e com baixa frequência. Considera que os alimentos devem ser obtidos a partir de processos de produção que usem o mínimo de recursos, de origem local e consumidos sazonalmente.
Na nossa realidade edafo-climática e geográfica, a Dieta Planetária não é mais do que a Dieta Mediterrânica, reconhecida pela Direcção Geral de Saúde (DGS).
A relação entre a maior adesão à dieta mediterrânica e uma boa saúde, medida por indicadores de saúde tem vindo a ser reforçada em cada vez mais estudos.
Impacto da Dieta Mediterrânica na sustentabilidade
Os alimentos de origem vegetal e de época, produzidos localmente, assim como as práticas agrícolas que maximizam o uso de recursos, contribuem para uma baixa pegada ecológica e maior sustentabilidade ambiental.
A associação entre a produção e a transformação de produtos numa mesma região é também um contributo para a sustentabilidade social e económica das diferentes regiões.
Em populações rurais e agrícolas, tem ainda a vantagem de contribuir para maior valorização e capacitação das mulheres. As mulheres têm aqui um papel particularmente importante, e muitas vezes sub-valorizado, pois estão ligadas a atividades agrícolas e são as principais responsáveis pela seleção e preparação dos alimentos.
O desconhecimento da Dieta Mediterrânica
Apesar das vantagens da Dieta Mediterrânica e dela fazer parte da nossa identidade, a verdade é que nos estamos a afastar cada vez mais deste padrão alimentar.
Dados da DGS, de 2020, mostram que ainda há um número elevado de pessoas que desconhece a Dieta Mediterrânica e que, possivelmente a associa a um tipo de regime alimentar de restrição. Mais preocupante ainda é o fato de ser nos jovens adultos que a escolha da Dieta Mediterrânica mais diminui.
Certamente que as rotinas laborais, o menor tempo para a preparação e confeção de alimentos, juntamente com a perda de algumas competências culinárias e menor tempo dedicado pelas famílias à cozinha são fatores a considerar na degradação nos padrões alimentares.
A Dieta Mediterrânica e o futuro
Há a necessidade de salvaguardar a Dieta Mediterrânica, de repensar estratégias para aproximá-la da sociedade de hoje e, em simultâneo, aproveitar melhor os ensinamentos alimentares dos nossos pais e avós.
Neste contexto de alterações climáticas, aderir à Dieta Mediterrânica é o grande contributo que podemos dar à saúde humana, ao planeta e à sustentabilidade económica e social.