Falar sobre o Cancro-resinoso-do-pinheiro é, acima de tudo, alertar para a necessidade de estabelecimento de adequadas medidas de prevenção e, bem assim, para a consciencialização da importância que as matérias de natureza fitossanitária, lato sensu, adquirem hoje em dia, com particular enfoque para o bom estado sanitário das sementes e plantas de viveiro, de modo a evitar a instalação de pragas e doenças, cujos danos e prejuízos que advêm da sua dispersão e instalação em novas áreas, de modo algum poderão ser negligenciados.Com efeito, o fungo Fusarium circinatum Nirenberg & O’Donnell, também conhecido por “cancro-resinoso-do-pinheiro”, pode causar uma mortalidade significativa em Pinus spp. e danos apreciáveis em  Pseudotsuga  menziesii, razão pela qual está classificado como praga de quarentena, existindo regulamentação Comunitária específica, que estabelece medidas de proteção fitossanitária contra a sua introdução e propagação no território da União Europeia,  previstas na Decisão de Execução (UE) 2019/2032 da comissão, de 26 de novembro, de aplicação direta em Portugal e ainda  na Portaria n.º 294/2013, de 27 de setembro com vista à sua regulamentação no direito nacional.

Desde a deteção desta praga em Portugal, ocorrida em 2008, que têm sido implementadas medidas de proteção fitossanitária no sentido da sua prevenção e controlo. Tais medidas, encontram-se materializadas no Plano de Ação para prospeção e erradicação do Cancro-resinoso-do-pinheiro, integrado nos objetivos e linhas de atuação previstas no Programa Operacional de Sanidade Florestal (POSF), documento orientador de estratégias, medidas e procedimentos adequados à prevenção e controlo de pragas florestais em geral, assim como facilitador de uma ação concertada entre entidades públicas e privadas neste âmbito.

Embora a dispersão deste fungo possa ocorrer pelo ar, água ou insetos, a principal via de disseminação é a circulação de sementes e plantas (incluindo contentores e substratos), em particular entre Estados-Membros, pelo que foi neste contexto, e com a consciência da necessidade de encontrar novas e complementares formas de prevenção desta doença, que surgiu a oportunidade de se estudarem potenciais métodos de desinfeção a aplicar nas diferentes fases de produção de plantas florestais. Foram ensaiados novos métodos de desinfeção, dirigidos às sementes, aos próprios contentores e à água de rega das plantas, tendo em vista a minimização do risco de dispersão deste fungo, garantindo, em simultâneo, que não são afetadas, de forma significativa, a capacidade germinativa das sementes nem a qualidade final das plantas produzidas e que foram materializadas no projeto do Grupo Operacional (GO) para Desenvolvimento de Estratégias Integradas para Prevenção do Cancro Resinoso do Pinheiro (PDR2020-101-031057), que decorreu entre 1 de outubro de 2017 e 31 de dezembro de 2021 e que contou com o envolvimento de 14 parceiros (https://www.icnf.pt/apoios/pdr2020/operacao101fitossanidade).

De igual modo, foram estudados outros materiais, alternativos à casca de pinheiro, como componente arejador de substratos à base de turfa.

Este GO alcançou todas as metas previstas e os resultados obtidos foram positivos, apresentando potencial para serem adotados pelos viveiros florestais. O culminar deste GO traduziu-se também na produção de um manual técnico, que pode ser consultado em: https://www.icnf.pt/api/file/doc/afd19bd0b7e6d3ca, referenciando no seu capítulo “3. Recomendações” quais os tratamentos que obtiveram melhores resultados na desinfeção de sementes, de contentores e de água de rega e que se revelaram ser os mais ajustados em contexto real. As recomendações indicam: (i) Quais os tratamentos a aplicar; (ii) Como preparar os produtos e aplicar o tratamento; e (iii) Quando aplicar o tratamento.

A existência de diversos tratamentos para algumas das situações estudadas, permitirá ao viveiro a escolha daquele que melhor se ajusta à sua logística, à disponibilidade dos produtos e à relação custo-benefício, recomendando-se, preferencialmente e sempre que possível, os tratamentos ambientalmente mais amigáveis.

Durante a aplicação dos tratamentos devem ser consideradas as precauções de uso e as informações contidas nas fichas técnicas, para garantir que o processo decorre da forma mais segura possível. Destaca-se a importância da utilização de equipamento de proteção individual (luvas, máscara, óculos e fato de proteção) durante o manuseamento de cada produto. Essencial é, também, assegurar que os produtos, quando adicionados à água, são devidamente misturados até se obter uma mistura homogénea (i.e. uma solução).

Desinfeção de sementes

Tratamentos que se revelaram mais eficazes na eliminação do fungo das sementes e que não induziram efeitos negativos nas taxas de germinação, nem tampouco na qualidade das plantas obtidas em viveiro:

Desinfeção de contentores

Os contentores representam também uma potencial via de dispersão do fungo Fusarium circinatum, pelo que a sua desinfeção é uma forma de evitar ou minimizar a dispersão do fungo, tendo em atenção que, muitas vezes, são os mesmos reutilizados e circulam com frequência entre os viveiros e os locais de plantação. Assim, o tratamento com peróxido de hidrogénio (H2O2) na concentração de 20% foi o mais eficaz na completa eliminação de Fusarium circinatum.

Desinfeção da água de rega

Os fungos podem ser facilmente transmitidos pela água, pelo que, a água de rega, deve ser tida em conta para evitar contaminações e prevenir a disseminação do Cancro-resinoso-do-pinheiro. Os tratamentos que se revelaram mais eficazes na eliminação do fungo da água de rega e que não induziram efeitos negativos, nem nas taxas de germinação nem na qualidade das plantas obtidas em viveiro foram os seguintes:Novos substratos

A casca de pinheiro é um componente <dos substratos de cultivo muito utilizado em viveiros florestais. No entanto, por ter origem numa espécie hospedeira do fungo, é um dos possíveis meios para a sua dispersão, pelo que para os viveiros de produção de plantas hospedeiras do fungo Fusarium circinatum é da máxima relevância promover a utilização de matérias-primas alternativas na formulação de substratos. Em alternativa à casca de pinheiro, e como componente arejador dos substratos à base de turfa, recomendam-se os seguintes materiais:

  1. Perlite com granulometria entre 2-6 mm;
  2. Granulado de esferovite com dimensões entre 8 e 12 mm;
  3. Granulado de cortiça de alta densidade com terras (granulado ADT) com dimensões entre 1 e 2 mm; e
  4. Falca proveniente das operações de poda e limpeza dos sobreiros.

As recomendações apresentadas são também elas enriquecedoras e poderão contribuir para encontrar novas formas e métodos inovadores, conducentes com práticas sustentáveis em prol de um ambiente mais saudável e resiliente a pragas e doenças, contextualizadas com a realidade que vivemos e devidamente compatibilizadas com a preservação e promoção de outros valores.

Dá-se uma última nota sobre a importância dos resultados obtidos com a implementação deste projeto, não só para os viveiros propriamente ditos, mas para toda a sociedade civil em geral, tendo em conta os ganhos, a vários níveis e de várias naturezas, que o desenvolvimento, demonstração e publicitação destas práticas representam e que apenas foi possível graças à dedicação e incansável esforço de todos os parceiros envolvidos na sua execução.

Autoria:
Dina Santos, Coordenadora do Grupo Operacional “Desenvolvimento de Estratégias Integradas para Prevenção do Cancro Resinoso do Pinheiro”

Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, I.P.
E-mail: dina.ribeiro@icnf.pt

→ Artigo publicado na edição de agosto/setembro 2023