Mantem-se atual a Carta da Lavoura Portuguesa, aprovada no Encontro Fundador da CNA, a 26 de Fevereiro de 1978, em Coimbra:
“A Lavoura tem de ser ouvida. Do campo saem os alimentos para toda a população. Ou melhora a nossa situação e então a Lavoura sente-se animada, apoiada e com condições para produzir ou então estamos mal. E connosco está mal todo o País. Certos da verdade das nossas palavras e da justiça que nos assiste, temos que todos juntos fazer ouvir a nossa voz e valer os nossos interesses e direitos”
Nestas circunstâncias, a CNA não pode deixar de manifestar a sua preocupação face aos recentes desenvolvimentos no sector.
Medidas “avulso” não resolvem problemas estruturais do sector CNA e Filiadas exigem alteração às políticas de mercado e a valorização dos Baldios.
Os protestos dos agricultores que ecoam por toda a Europa, incluindo em Portugal, nomeadamente com duas grandes manifestações da CNA e Filiadas, em Estarreja (2 de Fevereiro) e Vila Real (7 de Fevereiro), têm razões profundas que não se resolvem apenas com medidas “avulso” que, embora necessárias, são insuficientes para dar resposta aos problemas estruturais do sector e para dignificar a actividade dos agricultores.
O anúncio célere por parte do Governo de que seria possível reverter os cortes nos ecorregimes, nomeadamente na Agricultura Biológica e na Produção Integrada, na sequência da proposta assumida em primeiro lugar pela CNA, revela que teria sido possível assegurar a manutenção dos apoios, sem ser necessário o pronto protesto e luta dos agricultores, que foi o elemento que forçou o Governo a passar de palavras as medidas concretas.
Contudo, é necessário ir muito mais longe na resolução dos problemas. No imediato, a CNA e as suas Filiadas não aceitam a discriminação dos baldios nas ajudas da PAC, com a aplicação de um anacrónico coeficiente de redução de 50% nas áreas de pastoreio, que constitui um brutal corte nos rendimentos dos agricultores e compartes que praticam agricultura em zonas de minifúndio e de montanha e que necessitam do baldio para apascentar os seus animais. Estão em risco milhares de explorações, a maioria de pequena e média dimensão, que deixam de ter viabilidade económica.
A 8 de Fevereiro, um dia depois da grande manifestação em Vila Real, a CNA reuniu com o Secretário de Estado da Agricultura que se comprometeu a reverter estes cortes. A CNA mantém-se atenta à palavra dada e aguarda uma decisão célere e positiva do Governo. O que se tem assistido até agora, quanto ao que aos pequenos e médios agricultores diz respeito, esta Ministra e este Governo são muito pouco lestos a resolver os vários problemas identificados. É uma dualidade de critérios incompreensível.
A CNA e Filiadas não calarão a sua voz de protesto face a uma discriminação inaceitável aos territórios comunitários, aos seus compartes e à Agricultura Familiar!
Este desinteresse e penalização que o Governo impõe às pequenas explorações agrícolas vem já desde a definição do próprio Plano Estratégico da PAC (PEPAC) com os cortes aplicados nos Pagamentos aos Pequenos Agricultores, que chegam a perder metade da ajuda em relação a 2022.
Esta PAC fraca com os “fortes”, quando se recusa a aplicar limites nas ajudas para os grandes “recebedores”, mas que não hesita em penalizar as explorações de menor dimensão, não serve os interesses dos agricultores e do país.
Perante uma PAC que falhou em toda a linha nos objectivos que apregoou, não necessitamos apenas de simplificação da PAC, precisamos de uma alteração de fundo! As simplificações são bem vindas, mas sem rendimento e medidas que promovam a melhoria das condições de vida dos Agricultores não passamos de meros paliativos para dizer que se está a fazer alguma coisa.
A CNA manter-se-á atenta à concretização destas promessas para que elas não tenham significado apenas uma preocupação eleitoral.
Melhorar preços à produção e dignificar a actividade agrícola
Ainda que os mais recentes cortes tenham sido a gota de água para um copo a transbordar de dificuldades, os agricultores continuam a não encontrar nos anúncios do Governo e de Bruxelas soluções para dar resposta a um problema antigo: necessidade de escoamento a preços justos à produção!
É preciso ouvir e dar resposta aos agricultores! O que está na rua é um manifesto e antigo descontentamento face décadas de políticas que em nada têm contribuído para a dignificação do trabalho dos agricultores, da alimentação da população e da necessária vitalidade do mundo rural.
Os preços miseráveis pagos a quem produz; a voracidade com que a grande distribuição explora agricultores e consumidores para engordar lucros; o açambarcamento da terra e de outros recursos pelo grande agro-negócio e pelos fundos de investimento que nunca pisaram um centímetro da terra que compram como se fosse uma acção em bolsa, a proliferação de tratados de livre comércio e as importações desnecessárias que criam enormes dificuldades ao escoamento da produção nacional a preços compensadores… tudo conflui para esmagar quem trabalha a terra e daí tira o seu sustento.
A CNA reclama a implementação de medidas de regulação do mercado e da produção, o controlo das importações desnecessárias e o fim dos tratados de livre comércio como o que está a ser negociado entre a União Europeia e o Mercosul.
Perante crises cada vez mais frequentes, é cada vez mais urgente construir políticas agrícolas que cumpram os desígnios da Soberania Alimentar, no respeito da Declaração dos Direitos Camponeses e outras Pessoas que Trabalham em Zonas Rurais que, em Portugal, se cumprirá com a implementação do Estatuto da Agricultura Familiar.
Estas e outras reclamações ficaram plasmadas num Caderno de Reclamações aprovado na Manifestação de Vila Real, dirigido aos Órgãos de Soberania e aos partidos políticos, para que este Governo e o que sair das eleições de 10 de Março, bem como a Assembleia da República, construam políticas capazes de promover a melhoria das condições de vida dos agricultores e o desenvolvimento da produção nacional.