Para devolver a previsibilidade de produção da pera Rocha que está a perder-se atualmente na comunidade dos fruticultores e de técnicos da região Oeste, a Associação dos Produtores Agrícolas da Sobrena (APAS) divulga este artigo que pretende dar destaque às verificações comprovadas e/ou testadas que explicam determinados fenómenos que ocorrem na Natureza, bem como, a indicação de paradoxos na perceção dos factos que confundem o raciocínio.

Deste modo, é feita uma análise holística sobre o controlo da Estenfiliose no ecossistema agrário do pomar de pereira Rocha.

Na versão completa deste artigo são detalhados os fundamentos e sintetizados os ajustamentos fundamentais ao itinerário técnico da produção de pera Rocha para a redução significativa da doença (inferior a 5% de incidência), em pomares com históricos de estragos elevados e recorrentes.

A Estenfiliose causada pelo fungo [(Stemphylium vesicarium (Wallr.)) E.G. Simmons], é atualmente uma das doenças da pereira que mais aflige os fruticultores e técnicos. Recentemente, tem sido denominada por Doença-das-Manchas-Castanhas por ter sido concluído em diversos estudos nacionais e internacionais que o fungo causador da Alternariose (Alternaria sp.) em pereira aparece também junto com o anterior, no ataque aos frutos e folhas na pereira (Pereira e Rego, 2023).

A imagem exibe diversas imagens dos tipos de estragos ou lesões provocadas por esta doença.

Estima-se que em Portugal, anualmente, em média se perca cerca de 15% da produção nacional devido a esta doença.

Como atualmente não há um produto fitofarmacêutico ou outro tipo de produto que isoladamente consiga proteger de forma eficaz (>90% de eficácia) os frutos, este problema tem-se repetido em vários anos nas duas últimas décadas. Infelizmente, esta constatação factual já tem sido experienciada por muitos fruticultores e técnicos. Apesar disso, impera ainda a convicção generalizada de que um produto desse tipo é que resolverá o problema e, se necessário, com aplicações fitossanitárias semanais durante todo o ciclo vegetativo. Em suma, nos anos com factores mais propícios à doença, a imensa “proteção” em desespero de causa em muitos casos, acaba por resultar em perdas de frutos da ordem dos 30% a 80%.

Mas quais serão esses fatores propícios?

Esses fatores são os diversos mecanismos multidisciplinares que se inter-relacionam e que estão na base do combate a esta doença. Na expressão destas inter-relações, surgem por vezes aparentes contradições na perceção empírica das causas plausíveis. Pois, quando há uma convicção de que tudo foi feito para não haver estragos significativos, mas no final esses estragos ocorrem na mesma, gera-se uma “revolta” de impotência. Por conseguinte, a descrença nos produtos e nos técnicos por parte dos fruticultores sucede-se, sempre naqueles anos com estragos elevados e generalizados. Contudo, nos anos de baixo risco e consequentemente reduzidos estragos, a comunidade considera ter superado o problema. Todavia, basta voltar novamente um ano de elevado risco para que tudo se repita com estragos generalizados.

A esperança que se deixa aqui é, existem já alguns indicadores que permitem prever a tendência, numa fase precoce do ano ou do ciclo vegetativo, que indicam se o ano tende para estragos generalizados e severos ou, para estragos pontuais ou de pequena escala. Esta abordagem já permitiu em 2022 e 2023 a redução significativa da doença (inferior a 5% de incidência), em diversos pomares com históricos de estragos elevados e recorrentes.

A imagem seguinte, que pretende facilitar a visualização das inter-relações propostas entre cada fator que interfere no processo de controlo da doença da Estenfiliose. A figura 2b ilustra os fatores associados ao processo de controlo da doença do Pedrado (Venturia pyrina Aderh.) causada por um fungo que igualmente ataca frutos e folhas. Contudo, esta imagem exibe a simplicidade da tomada de decisão simplificada focada na lógica do “tratamento químico” (produto fitofarmacêutico com eficácia superior a 90%) para a protecção da pereira contra o Pedrado. Pretende-se assim evidenciar as diferenças a ter em consideração para a tomada de decisão na proteção da pereira a ambas as doenças. Constata-se então que, a proteção da pereira contra a Estenfiliose é incompleta quando apenas focada na lógica do “tratamento químico”.

1. Os fatores associados na tomada de decisão

Para a correta tomada de decisão na proteção da pereira contra a Estenfiliose, à luz do conhecimento atual, deveremos ponderar cada um dos fatores que constam na figura 2a. Cada fator a descrever a seguir será associado a factos registados no terreno ou à evidência científica.

1.1. Nível de vingamento

Este fator pondera o grau de extração de nutrientes e/ou do consumo da reserva de fotoassimilados por parte da pereira. Assim, é importante distinguir em cada pomar ou exploração frutícola, qual é a produtividade habitual ou normal no histórico do pomar.

Verificamos em diversos pomares que com moderados vingamentos obtém-se uma moderada a baixa monda de frutos e, uma tendência para menor incidência de frutos atacados por Estenfiliose à colheita. No final do processo é colhida a mesma quantidade, os tais 30 a 40 t/ha, com frutos de maior calibre e com mais açúcar (ºBRIX). Em suma, menores custos e maior valor da produção.

1.2. Fertilização

Este fator pondera o grau de extração de nutrientes por parte da árvore para uma expectativa de produtividade. Assim, os cálculos das Unidades de Fertilizante (UF) determinadas em sede dos Planos de Fertilização devem ser executados, principalmente nos casos de alta produtividade, sob pena das plantas poderem descompensar futuramente.

Os nutrientes podem então reduzir a doença a um nível aceitável, ou pelo menos, a um nível em que seja possível uma melhor estratégia de luta através de outras práticas culturais ou soluções orgânicas conseguindo ser bem-sucedidas e com menor custo (Dordas, 2008).

Mais do que as UF a aplicar é fulcral criar as melhores condições para a boa absorção radicular e posterior assimilação dos nutrientes por parte das árvores, no tempo certo e sem grande dificuldade. Ou seja, devemos criar as condições para que a raízes absorventes (com pêlos radiculares) dos nutrientes (raízes “pastadeiras” – termo usado na gíria local) consigam fazer o seu trabalho (…).

→ Leia o artigo completo na Revista Voz do Campo: edição de fevereiro 2024

João Azevedo – Coordenador do Departamento Técnico
APAS – Associação dos Produtores Agrícolas da Sobrena (joaoazevedo@apas.com.pt)