O ano de 2023 foi tudo menos tranquilo no que diz respeito ao setor agroalimentar, tal como à atividade agrícola que lhe serve de base, e não antevejo um ano de 2024 menos difícil e desafiante.

A instabilidade dos mercados internacionais, quer pela continuação da guerra na Ucrânia, quer pela constante emergência de novos conflitos militares com possível impacto nos mercados globais, não nos pode deixar tranquilos relativamente ao esperado decréscimo da inflação, nem em relação a uma desejada redução do custo dos fatores de produção agrícola, designadamente combustíveis, energia e fertilizantes.

A isto acrescem eleições, não apenas em Portugal, mas também, por exemplo, nos Estados Unidos, cujos resultados poderão perturbar um desejável equilíbrio nas relações internacionais e na estabilização dos mercados, em particular no que diz respeito ao setor agroalimentar.

Todas estas perturbações surgem num contexto de previsível aumento significativo da população mundial ao longo das próximas décadas e, de acordo com a Organização das Nações Unidas, da urgente necessidade de aumentar exponencialmente a produção mundial de alimentos, para corresponder a esse aumento populacional.

Este enquadramento cruza ainda com as alterações climáticas e com os desafios que as mesmas colocam à atividade agrícola e, consequentemente, ao setor agroalimentar

Em Portugal, as dificuldades são já bastante visíveis. Lidamos há vários anos com secas recorrentes e falta de água para regadio, concomitantemente com governos insensíveis ao problema e incapazes de estabelecer um plano nacional de gestão dos recursos hídricos, fundamental para a constituição de uma rede nacional de água, com base em infraestruturas de retenção, armazenamento e transporte de água ao longo de todo o território nacional, de acordo com as necessidades pontuais das várias regiões.

O recente problema crítico de falta de água no Algarve deveria servir para nos alertar a todos, começando pelo poder político – o único que verdadeiramente tem capacidade para intervir nesta matéria, a nível nacional – no sentido de definir um plano nacional sobre a gestão de recursos hídricos. Neste caso, não é possível imaginar um calendário de 50 anos, semelhante à decisão sobre o novo aeroporto de Lisboa, sob pena de ficarmos sem atividade agrícola e sem produção de alimentos.

O setor agroalimentar lida ainda com um conjunto de outros importantes desafios.

A qualidade dos nossos produtos é reconhecida internacionalmente, mas precisamos de promovê-los nos mercados externos, acrescentando-lhe marca e valor

Falta-nos inclusivamente uma marca chapéu nacional que de forma eficaz ajude os produtores a beneficiar comercialmente desta qualidade reconhecida. Veja-se por exemplo que na recente escassez de azeite, Portugal contribuiu enormemente para abastecer mercados como o espanhol e o italiano, nos quais este é um produto de grande importância e exigência.

O setor agroalimentar parte da produção, passa pela transformação e culmina na distribuição. Nessa matéria, continuaremos em 2024 uma articulação que existe de forma regular há muitos anos com a distribuição, procurando resolver as diferenças entre as duas áreas de atividade de uma forma colaborativa, inclusivamente com o estabelecimento de protocolos em diversas áreas e sobre múltiplos aspetos da relação entre os dois setores.

Os desafios são, portanto, muitos e difíceis, mas o setor agroalimentar é fulcral para a nossa existência, uma vez que precisamos de nos alimentar quotidianamente e os produtores têm vindo a demonstrar a sua resiliência, ultrapassando vários desafios ao longo dos últimos anos. Cada vez mais, deveremos prosseguir um caminho de articulação entre produção, transformação e distribuição, no sentido de fortalecer o setor agroalimentar.

→ Leia o artigo de opinião na Revista Voz do Campo: edição de fevereiro 2024