A primeira conferência sobre a Lã a juntar toda a fileira decorreu no dia 2 de março em Évora e foi organizada pela Associação Nacional de Criadores de Ovinos Merino, a ANCORME.

Integrada nas XV Jornadas Internacionais do Hospital Veterinário Muralha de Évora, esta foi uma oportunidade para a valorização desta fibra natural, que começa na ovelha e termina na camisola. Ouvir quem produz e valorizar o potencial comercial e ambiental da lã foi o objetivo central desta conferência que juntou à mesa industriais do sector, designers, associações e produtores de ovinos.

Programas de educação nas escolas, que passam por levar as crianças ao campo conhecerem os processos de produção, e comunicar a lã como um produto sustentável e amigo do ambiente foram algumas das ideias debatidas e que podem ser concretizadas.

Jeannette Cook, consultora de comunicação na International Wool Textile Organisation, apresentou uma visão global do mercado da lã sublinhando que na Europa os consumidores valorizam esta matéria-prima natural e sustentável à medida que a poluição têxtil dispara devido ao aumento da fibra sintética, associada à mão de obra barata. Há que mostrar ao consumidor a Pegada Ecológica do Produto (PEF) e isso faz-se através de campanhas de comunicação. “A campanha “make the label count” pressupõe uma etiqueta com um código que traduza que o sistema de produção reduz a PEF e que esta questão valoriza o produto natural que polui menos, é biodegradável e sustentável”, acrescenta a consultora referindo que, à semelhança do impacto de uma má alimentação no nosso organismo, também os tecidos sintéticos afetam negativamente a nossa saúde e bem-estar.

André Almeida, professor no ISA, mostrou a importância da nutrição na qualidade da lã. “Sabemos que a lã é uma matriz proteíca e por isso é uma matéria-prima biodegradável. Se o animal não tiver uma boa nutrição a qualidade da lã fica comprometida”, acrescenta o professor que defende que sempre que possível o produtor deverá investir na suplementação dos animais para além de uma boa gestão de pastagens à base de leguminosas. João Almeida, produtor de ovinos, alertou para os cuidados a ter no momento da tosquia e do acondicionamento  para que se mantenham os parâmetros de qualidade. “Há que destacar também o potencial simbólico da lã na medida em que solos pastoreados corretamente sofrem menos erosão, assim como sabemos que, territórios pastoreados têm menos incêndios”, afirma o produtor destacando o papel do associativismo como fundamental para ganhar escala e aumentar o potencial negocial dos produtores de lã. A questão da certificação é aqui fundamental para que a lã possa ser comercializada em mercados mais exigente. O consumidor pretende saber o que está a comprar e, para isso, tem que haver entidades imparciais e acreditadas para certificarem todas as fases do processo. Luís Marques da DECATHLON partilhou quais são os desafios da lã merina na produção de vestuário destacando as suas características únicas como suavidade, conforto, respirabilidade, resistência ao odor e durabilidade, ideal para o trekking. “Unir o produtor à indústria para que se consiga um aprimoramento da raça merina que produza uma lã mais fina e eu possa oferecer uma peça 100% feita em lã” refere ser este o grande desafio que está disposto a abraçar em parceria com a ANCORME. A fileira industrial em Portugal  também esteve muito bem representada e está a trabalhar para redinamizar o conhecimento ancestral respondendo às exigências da indústria moderna. É o caso da Têxtil Manuel Tavares, situada na Guarda, onde existe o único lavadouro do país e da empresa “A Penteadora”, representada por António Teixeira, que refere a indústria da lã como a mais sustentável do mundo uma matéria-prima flexível, durável e amiga do ambiente. Isabel Costa, fundadora da Burel Factory, acredita profundamente que há uma enorme tendência no mundo para o consumo de lã. A empresária mudou de vida há 20 anos e dedicou-se à recuperação do património industrial que foi descobrindo na Serra da Estrela. “O equipamento estava morto, mas havia o conhecimento e quando as indústrias fecham o que se perde é o know how, muitas vezes irrecuperável. Foi este legado que nos levou a investir neste património único com o propósito de valorizar as lãs locais pegando no burel, o tecido mais pobre usado pelos franciscanos. Começámos a comprar aos pastores da Serra da Estrela lã de ovelhas das raças mondegueira e churra e apostámos em mantas, cachecóis e camisolas”, acrescenta a empreendedora que levou mais tarde a lã para a arquitetura de interiores. Esta matéria-prima traz um conforto acústico e térmico inigualável. Reduz o consumo de energia e tem uma capacidade ímpar de absorver a humidade. Também é usada na indústria farmacêutica no embalamento de medicamentos que necessitem de climatização. A lã é a fibra mais sustentável do mundo e a prova disso é que desde sempre aqueceu e vestiu a humanidade. É fundamental passar esta mensagem ao consumidor para que o mercado da lã volte a animar e os produtores possam também ter o respetivo retorno apostando na melhoria genética dos seus rebanhos.

A “Wool Conference 2024” contou, ainda, com uma exposição de peças de design em lã das marcas Rosa Pomar, Xi Coração e Fabricaal. Tiago Perloiro, secretário técnico da ANCORME, referiu a importância do encontro que juntou alguns dos maiores especialistas no sector da Lã a debaterem as últimas tendências e inovações tecnológicas utilizadas na produção e transformação desta fibra natural. Com uma audiência atenta e participativa a “Wool Conference” voltará a realizar-se em 2026.