Problemática – O nemátode das lesões radiculares, Pratylenchus penetrans

O nemátode-das-lesões-radiculares (NLR), Pratylenchus penetrans, é um endoparasita migratório que afeta culturas agrícolas economicamente importantes, como a batata, estando atualmente presente na lista de pragas reguladas não sujeitas a quarentena A2 da União Europeia (UE 2016/2031). Em alguns países europeus, como Portugal, esta espécie foi detetada em campos de produção de batata estando relacionada com o seu baixo rendimento (Figura 1A) (Esteves et al., 2015, Orlando et al., 2020; Figueiredo et al., 2021). O ciclo de vida do NLR ocorre dentro da raiz (Figura 1B), e a sua alimentação centra-se nas células epidérmicas e corticais. A infeção radicular resulta em lesões acastanhadas nos pontos de entrada/saída, provocadas pela ação do nemátode durante a migração e alimentação, levando à formação de extensivos danos celulares no sistema radicular, necroses, e, frequentemente, distorção e/ou atrofia (Vicente et al., 2021). Os danos nas raízes causados pelos NLRs resultam num fraco crescimento das plantas e consequentes perdas nas colheitas (Gil et al., 2021).

Tradicionalmente, o controlo dos nemátodes fitoparasitas assenta em boas práticas agronómicas e na aplicação de compostos nematodicidas de origem sintética. O pousio ou a rotação de culturas são as práticas mais comumente usadas pelos agricultores, contudo a situação de pousio é economicamente inviável sendo apenas empregue como último recurso. A rotação implica a escolha de culturas não suscetíveis ao nemátode (de difícil escolha face ao elevado número de plantas hospedeiras).Figura 1 Os nemátodes das lesões radiculares: campo de batata infestado com Pratylenchus penetrans (Bélgica; Moens and Perry, 2009) (A); juvenil de P. penetrans no interior de raiz de batata (NemaLab-MED) (B)

A seleção de variedades resistentes é uma medida agronómica significativa, mas face ao anteriormente referido, a existência de variedades resistentes é limitada nas culturas mais significativas. A aplicação de nematodicidas de origem sintética pode ser efetuada por fumigação, destacando-se o bromometano (brometo de metilo), metam-sódio ou 1,3-dicloropropeno. Dos compostos não fumigantes destacam-se o aldicarb, o oxamil e o carbofurano. A aplicação dos compostos referidos consome tempo, recursos e custos económicos e a sua aplicação acarreta dificuldades logísticas traduzindo-se em custos adicionais de produção e, principalmente, na contaminação ambiental e em riscos para a saúde do consumidor (Pathak et al., 2022). As restrições atualmente existentes contra a utilização dos compostos, faz com que seja necessário criar estratégias de controlo e investir em abordagens mais sustentáveis para atenuar os danos provocados pelos NLR.

Devido a restrições ambientais (maioritariamente na União Europeia) e em parte pela pressão dos consumidores, a investigação da indústria agrícola tem-se focado no desenvolvimento de produtos com uma base biológica, também conhecido por biocontrolo.

Os nematodicidas referidos assentam a sua atividade em bactérias (Bacillus velezensis, Pasteuria nishizawae), por ação de compostos naturalmente produzidos, ou em fungos (Pochonia chlamydosporia, Paecilomyces lilacinus), por ação físico-química diretamente nos nemátodes ou com a destruição dos seus ovos. O processo de investigação do biocontrolo é bastante moroso, e a indústria foca-se agora em compostos de origem natural, biodegradáveis, com baixo efeito tóxico para o solo, para organismos aquáticos e para a saúde humana. Os novos produtos terão por base óleos essenciais, extratos de plantas, compostos produzidos por plantas, algas ou subprodutos dos processos industriais que apresentam direta e indiretamente (por volatilização) um efeito nematodicida eficaz (Figura 2). Outros exemplos são resíduos de sementes de brássicas (mostarda, repolho ou brócolos) empregues pela ação supressiva do NLR, ou cravo-túnico (Tagetes patula), reconhecido pela eficácia na redução da população de NLR em campo.Figura 2 Ação de compostos nematodicidas extraídos de plantas no nemátode das lesões radiculares, Pratylenchus penetrans: (A) nemátodes vivos em água; (B) nemátodes mortos após 24 horas de contato direto (NemaLab; Barbosa et al., 2024)

A procura da solução – a investigação em curso no projeto PratyOmics

A metabolómica de plantas é uma área recente no estudo da resistência de culturas em resposta à infeção de nemátodes fitoparasitas, podendo acelerar o melhoramento de culturas e o desenvolvimento de novos pesticidas. No contexto da interação nemátode-planta, esta área desempenha um papel crucial, permitindo a identificação e a análise de metabolitos secundários, compostos químicos que são produzidos pelas plantas em resposta à presença de fatores abióticos e bióticos, como os nemátodes, potencialmente envolvidos na mediação da resistência do hospedeiro e, consequentemente, um alvo promissor na redução do impacto dos NLR (Patel et al., 2021; Salam et al., 2023).

O projeto PratyOmics – Metabolómica da planta para o controlo do nemátode das lesões radiculares Pratylenchus penetrans (PTDC/ASP-PLA/0197/2020), financiado em 2021 pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT/MCTES), conta com a participação de investigadores do Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV) (instituição proponente), e investigadores de instituições nacionais parceiras e um consultor internacional, nomeadamente, Instituto Mediterrâneo para a Agricultura, Ambiente e Desenvolvimento (Universidade de Évora), o laboratório HERCULES – Herança cultural, Estudos e Salvaguarda (Universidade de Évora), Centro de Biotecnologia Agrícola e Agro-Alimentar do Alentejo (CEBAL, Instituto Politécnico de Beja), o Centro de Ecologia Funcional (Universidade de Coimbra), e o United States Department of Agriculture (USDA, Estados Unidos da América).

O principal objetivo do PratyOmics consiste na análise comparativa do metabolismo global (metaboloma) de cultivares de batateira tolerantes e suscetíveis em resposta à infeção causada pelo P. penetrans, e consequente identificação de metabolitos (secundários) como potenciais agentes nematodicidas (Figura 3).

O projeto visa igualmente testar os compostos identificados e, para os promissores, compreender o modo de atuação no nemátode através de uma abordagem transcriptómica. Estudos já publicados, no âmbito do projeto, demonstraram a eficácia de compostos de diferentes classes químicas, candidatos para o desenvolvimento de bionematicidas como estratégia sustentável de gestão (Barbosa et al., 2024).Figura 3 Tarefas delineadas no âmbito da investigação do projeto PratyOmics. Para uma leitura mais detalhada, consultar: https://projects.iniav.pt/pratyomics

  • Artigo publicado Revista Voz do Campo – edição de abril 2024.

Bibliografia:

Barbosa, P., Faria, J.M.S., Cavaco, T., Figueiredo, A.C., Mota, M., Vicente, C.S.L. (2024) Nematicidal activity of phytochemicals against the root-lesion nematode Pratylenchus penetrans. Plants, 13, 726. https://doi.org/10.3390/plants13050726

Esteves, I., Maleita, C., Abrantes, I. (2015) Root-lesion and root-knot nematodes parasitizing potato. European Journal of Plant Pathology 141, 397–406 (2015). https://doi.org/10.1007/s10658-014-0551-1

Figueiredo, J., Vieira, P., Abrantes, I., Esteves, I. (2021) Detection of the root lesion nematode Pratylenchus penetrans in potato tubers. Plant Pathology 70:1757-1968. https://doi.org/10.1111/ppa.13425

Gil, D., Cardoso, J. M. S., Abrantes, I., Esteves, I. (2021). Pratylenchus penetrans parasitizing potato crops: Morphometric and genetic variability of Portuguese isolates. Plants, 10(3), 603. https://doi.org/10.3390/plants10030603

Moens, M., Perry, R. N. (2009) Migratory plant endoparasitic nematodes: a group rich in contrasts and divergence. Annual Review of Phytopathology. 47:313-332. 10.1146/annurev-phyto-080508–081846

Orlando, V., Grove, I.G., Edwards, S.G., Prior, T., Roberts, D., Neilson, R., Back, M. (2020) Root-lesion nematodes of potato: current status of diagnostics, pathogenicity and management. Plant Patholology 69: 405-417 https://doi.org/10.1111/ppa.13144

Patel, M.K., Pandey, S., Kumar, M., Haque, M.I., Pal, S., Yadav, N.S. (2021) Plants Metabolome Study: Emerging Tools and Techniques. Plants (Basel). 10(11):2409. doi: 10.3390/plants10112409

Pathak, V.M., Verma, V.K., Rawat, B.S., Kaur, B., Babu, N., Sharma, A., Dewali, S., Yadav, M., Kumari, R., Singh, S., Mohapatra, A., Pandey, V., Rana, N., Cunill, J.M. (2022) Current status of pesticide effects on environment, human health and it’s eco-friendly management as bioremediation: A comprehensive review. Frontiers in Microbiology. 13:962619. doi: 10.3389/fmicb.2022.962619

Salam, U., Ullah, S., Tang, Z.-H., Elateeq, A. A., Khan, Y., Khan, J., Khan, A., Ali, S. (2023) Plant metabolomics: An overview of the role of primary and secondary metabolites against different environmental stress factors. Life, 13(3), 706. https://doi.org/10.3390/life13030706

Vicente, C., Inácio, M. L., Mota, M., Vieira, P. (2021) O nemátode das lesões radiculares, Pratylenchus penetrans. Vida Rural, abril, 79-82.

Pedro Barbosa1, Marina Costa2, Margarida Espada1, Manuel Mota1, Dora Teixeira3, Teresa Brás4, Fátima Duarte4, Teresa Brás4, Joana Figueiredo5, Joana M. S. Cardoso5, Ivânia Esteves5, Isabel Abrantes5, Jorge Faria2, Ana Rita Varela2,1, Filomena Nóbrega2, Paulo Vieira6, Mª Lurdes Inácio2, Cláudia S. L. Vicente1,2

1MED – Instituto Mediterrâneo para a Agricultura, Ambiente e Desenvolvimento, Instituto de Investigação e Formação Avançada, Universidade de Évora, Évora, Portugal 

2INIAV, I.P. – Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária, Oeiras, Portugal

3Departamento de Química e Bioquímica da Escola de Ciências e Tecnologia & Laboratório HERCULES – Herança Cultural, Estudos e Salvaguarda, Universidade de

Évora, Évora, Portugal

4Centro de Biotecnologia Agrícola e Agro-Alimentar do Alentejo (CEBAL)/ Instituto Politécnico de Beja (IPBeja), 7801-908 Beja, Portugal

5MED – Instituto Mediterrâneo para a Agricultura, Ambiente e Desenvolvimento & CHANGE – Instituto para as Alterações Globais e Sustentabilidade, CEBAL, 7801-908, Beja, Portugal

6Centre for Functional Ecology – Science for People and the Planet, Laboratório Associado TERRA, Departamento de Ciências da Vida, Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal

7United States Department of Agriculture (USDA), Agricultural Research Service, Beltsville, Maryland, USAf


Agradecimento:

Este trabalho é financiado por Fundos Nacionais através da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia no âmbito: dos Projetos PratyOmics (PTDC/ASP-PLA/0197/2020) (10.54499/PTDC/ASP- PLA/0197/2020) e UIDB/05183/2020 (MED); da bolsa FCT SFRH/BD/134201/2017 para PB; e dos contratos de CSLV (CEECIND/00040/2018; 10.54499/CEECIND/00040/ 2018/CP1560/CT0001), de ME (CEECIND/00066/2018; 10.54499/CEECIND/00066/2018/CP1560/CT0003) e JMSF (2022.00359.CEECIND; 10.54499/2022.00359.CEECIND/CP1737/ CT0002).