A aparente incompatibilidade entre a agricultura o cumprimento das metas ambientais (de emissões de carbono, de preservação dos solos, de diminuição de uso de pesticidas, de gasto de água, de preservação da biodiversidade) tem gerado discussões acesas e o extremar de posições entre agricultores e ambientalistas. O Baixo Alentejo, enquanto território eminentemente rural suporta duas realidades distintas: um Alentejo com acesso ao regadio, onde se sente uma revitalização económica (mas também uma crescente discussão em torno dos impactos das produções super-intensivas), e um vasto território de sequeiro, em que predomina a produção pecuária, mas onde a escassez de água é cada vez mais visível, o que também ateia outras preocupações, nomeadamente pelos próprios agricultores. É sobre este território de sequeiro que nos debruçamos, no território que o Alqueva não alcança. Aqui, a desertificação intensifica-se: a paisagem de cores douradas prolonga-se por muitos mais meses do que seria desejável, árvores que antes produziam bolota em abundância, raramente se avistam e padecem moribundas, os solos são delgados, fustigados pelos séculos de exploração cerealífera, nos barrancos a água corre apenas uns dias e as charcas ressecam.

Mas será esta realidade inevitável? Será que insistir nas mesmas soluções irá trazer alguma mudança positiva? Ou será que existe uma forma de reverter a desertificação, diminuindo a erosão e infiltrando toda a água que cai no solo e que acaba por se perder por escorrência?

Em meados de 2020, um grupo de pessoas inquietas, incluindo agricultores, técnicos, investigadores e decisores locais, juntaram-se para refletir sobre estes constrangimentos e pensar possíveis soluções. Inspirados nas técnicas de retenção de água inovadoras, observadas numa herdade em Castro Verde (Monte do Seixo), refletiram sobre alternativas que estariam a ser adotadas em locais semelhantes e questionaram a pertinência de utilização das mesmas no Baixo Alentejo. Foi desenhada uma metodologia participada, que permitisse conhecer melhor essas alternativas e nasceu o Projeto Pastagens Regenerativas.

Experimentar novas soluções para problemas complexos implicaria uma abordagem multidisciplinar e bottom-up, não se pretendia apresentar um menu de soluções e receitas tipificadas pouco testadas no território de estudo, mas sim, fazer um processo de aprendizagem conjunto, participado e horizontal, baseada na agricultura regenerativa e num pensamento holístico. Adotou-se uma abordagem denominada Consortium benchmarking: formou-se uma Comunidade de Prática em Agricultura Regenerativa (CdP) e através de oficinas participativas, foram apresentadas diversas soluções em uso em situações semelhantes, nomeadamente técnicas de pastoreio regenerativo (inspiradas no maneio holístico) e a técnica do keyline (e do desenho hidrológico da paisagem). Formaram-se círculos para recolher quais as perguntas que os agricultores/as, investigadores/as e peritos/as queriam ver respondidas em relação às técnicas apresentadas. As dúvidas e necessidades de informação e conhecimento levantadas, induziram a condução do projeto, para a procura das respostas às mesmas.

Nesse sentido foram organizadas diversas visitas a quintas e herdades em Portugal e Espanha, em que estas técnicas já estariam em uso com resultados positivos. Em cada uma das visitas não só se observaram os sistemas de produção e se absorveu toda a experiência do agricultor na implementação de práticas como o keyline ou o pastoreio regenerativo, como também se aproveitou para realizar formações teórico-práticas sobre temas diversos, tais como pastoreio dirigido, planeamento do pastoreio, maneio holístico, regeneração do montado, agricultura regenerativa e comercialização direta de carne de pasto.

A observação das soluções em prática, em cenários semelhantes e as discussões entre pares, reforçaram a confiança dos intervenientes e o pequeno grupo de agricultores, começou a crescer de visita em visita, de workshop em workshop. O conhecimento observado, foi sendo sistematizado em workshops práticos e no blog do projeto1 (…).

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→ Leia o artigo completo na Revista Voz do Campo: edição de março 2024

Autoria: Marta Cortegano e Miguel Encarnação, ESDIME