Roger Vidal Cardos y Antoni Dalmau Bueno
Programa de Bem-estar animal – IRTA – (Instituto de Investigación y Tecnología Agroalimentaria) (roger.vidal@irta.cat)


Introdução:

A pecuária extensiva é um sistema de produção animal que se caracteriza pela utilização de grandes superfícies de terra, permitindo que os animais se movimentem mais livremente, manifestem os seus comportamentos naturais e se alimentem principalmente de erva natural. Existe um consenso geral sobre os benefícios da pecuária extensiva: fixar a população rural, manter ecossistemas abertos muito frágeis que dependem da ação dos rebanhos ou abastecer um mercado cada vez mais propenso a produtos provenientes de animais criados e mantidos em estado selvagem (Rodriguez et al., 2019). A perda da pecuária extensiva implicaria um abandono das áreas de pastagem, dos prados e das culturas nas zonas de montanha, com uma grande perda de biodiversidade para a flora e fauna adaptadas à vida nestas áreas abertas, um aumento da massa florestal e um maior risco de incêndios, alterações na paisagem e perda de património cultural.

No entanto, na criação extensiva, a monitorização regular dos animais é mais trabalhosa, uma vez que estes se encontram em áreas abertas e por vezes inacessíveis, onde são mais vulneráveis às intempéries, aos ataques de predadores, à perturbação de caminhantes ou dos seus cães, e que podem afetar negativamente o seu bem-estar (Treves et al., 2003). Por outro lado, existe o problema da substituição de gerações e do aumento dos custos de produção. A otimização dos recursos é, portanto, essencial para o seu futuro.

Pecuária de precisão

Nas vastas extensões montanhosas de terras de pastagem, a localização exacta e a monitorização constante do gado têm sido historicamente desafios significativos para os produtores (Turner & Dwyer., 2007). Não só os animais estão sujeitos a um ambiente menos previsível do que no sistema intensivo (com condições de criação controladas), como o agricultor nem sempre está disponível para monitorizar o estado dos seus animais, o que dificulta a deteção de alterações comportamentais ou problemas de saúde (claudicação, mastite, infeções, etc.), cujo tratamento atempado é importante para evitar perdas. Também é difícil antecipar o parto e, por conseguinte, assistir o animal e evitar complicações para a mãe e/ou o vitelo.

Neste sentido, a Pecuária de Precisão (PLF) é proposta como uma possível solução para melhorar o bem-estar animal, a produtividade económica e a conservação da paisagem (Berckmans, 2014; Kokin et al., 2007) e consiste na utilização de novas tecnologias e informação avançada para melhorar a gestão e o desempenho da produção (Bewley et al., 2010). O PLF utiliza uma combinação de ferramentas e métodos que medem diferentes variáveis de cada indivíduo e processam essa informação para auxiliar na conceção de estratégias de gestão pecuária. A identificação individual é um dos dispositivos mais utilizados e baseia-se na RFID (identificação por radiofrequência), permitindo o rastreio individual para uma gestão mais específica, como nos sistemas de alimentação automatizados.

Os acelerómetros são outros dispositivos que podem monitorizar a taxa de alimentação, os cuidados maternos, detetar doenças como a mastite ou prever o momento ideal para o desmame ou a frequência de ruminação em vacas leiteiras (Berckmans, 2006; Rutter, 2012). No entanto, a sua aplicação na pecuária extensiva é um desafio devido a ambientes grandes, inacessíveis, heterogéneos e altamente dinâmicos (Wishart et al., 2015; Morgan-Davies et al., 2017), para além dos problemas associados à autonomia energética e às questões de cobertura da rede.

Para resolver esta limitação e garantir a cobertura em áreas sem cobertura móvel, começou a ser utilizado um tipo de rede denominada Low Power Wide Area Networks (LPWAN), que faz parte da tecnologia denominada “Internet das Coisas” (IoT) e oferece conetividade sem fios de longo alcance a um grande número de dispositivos, com menor consumo de energia e menor custo do que as redes móveis, sendo a sua principal limitação a reduzida largura de banda. Entre as tecnologias LPWANs mais utilizadas na IoT estão: LoRaWAN e SigFox (Gomez, C. et al., 2019; Mekki, et al., 2019).

Outro aspeto claro do PLF são as plataformas de gestão de dados para otimizar a produção, melhorar a eficiência e reduzir os impactos ambientais através da aplicação estratégica de tecnologias de monitorização e gestão, permitindo decisões mais informadas e melhorando a produtividade e o bem-estar.

Podem também servir de atrativo para as novas gerações e facilitar o trabalho. Os colares de localização, por exemplo, permitem a monitorização em tempo real do comportamento, da localização e da temperatura da superfície através de um dispositivo móvel, que pode ser utilizado para evitar o sobrepastoreio em áreas críticas, redirecionando o rebanho, permitindo a regeneração natural das pastagens e melhorando a qualidade das pastagens (Castro et al., 2022).

Resultados do estudo com colares de localização

Um total de 53 363 sinais enviados por 18 colares de localização para bovinos (9), equinos (5) e ovinos (4) foram analisados durante a época de pastagem de verão de 2023 no Parque Natural Alt Pirineu (Pallars Sobirà, Espanha). Os sinais recebidos permitiram a criação de mapas de calor para avaliar em que áreas os animais passam mais tempo (Figura 3). Quanto maior for o número de sinais concentrados num ponto durante um período de tempo mais longo, maior é a intensidade e maior é a pressão dos animais. Comparando os mapas de calor entre espécies, verifica-se como estas se distribuem naturalmente de forma heterogénea, evitando a competição alimentar entre elas. Assim, os ovinos e as éguas passam grande parte do verão em zonas mais específicas e elevadas de prados e florestas, enquanto as vacas preferem prados maiores e planos e perto de grandes pontos de água, como o rio.

A distribuição dos animais está também relacionada com a diversidade dos habitats de montanha. O índice de seleção de Jacobs (JSI) para a área do rebanho é utilizado para identificar as comunidades vegetais preferidas pelos animais através do número de sinais e da sua área de pastagem. Este índice varia de -1 (seleção negativa) a +1 (seleção positiva) e indica quais os habitats preferidos pelo animal. No caso do nosso estudo, as vacas selecionaram positivamente os prados abertos (JSI=0,51), rejeitando áreas mais arborizadas e fechadas (JSI = -0,42). Já os cavalos e as ovelhas sentem-se mais confortáveis em habitats de pinhal (JSI = 0,52) (Figura 4). Estes resultados são fundamentais para uma gestão integrada das terras mais direcionada e eficaz (…).

→ Leia o artigo completo na Revista Voz do Campo: edição de julho 2024