A produção de caprinos na região Centro tem um impacto positivo na economia local, desempenhando um papel essencial na manutenção das comunidades rurais, na preservação dos ecossistemas, no controlo da biomassa e prevenção de incêndios. A produção de caprinos, realizada essencialmente em regime de pastoreio semiextensivo, expõe os animais a infeções parasitárias que têm um impacto negativo na saúde e bem-estar animal e geram perdas económicas significativas.

A maioria das infeções parasitárias dos pequenos ruminantes são subclínicas, ocorrendo sem que haja manifestação de sinais de doença. No entanto, estas infeções comprometem a ingestão de alimento, a taxa de crescimento, o peso e a qualidade da carcaça, o crescimento da lã, a fertilidade e a produção de leite, podendo ainda contribuir para aumentar a taxa de mortalidade, sobretudo no caso da infeção por várias espécies de parasitas. Os principais parasitas que afetam os caprinos são os helmintes, que incluem os nematodes, cestodes e trematodes, bem como as coccídeas, que são parasitas unicelulares. Estes parasitas infetam sobretudo os aparelhos respiratório e digestivo dos animais.

Os nematodes da família Protostrongylidae, nomeadamente Muellerius capillaris, infetam o aparelho respiratório dos caprinos, causando pneumonia parasitária. Estes parasitas apresentam um ciclo de vida indireto, necessitando da intervenção de um hospedeiro intermediário (lesmas e caracóis) para completar o seu ciclo. As larvas de primeiro estádio (L1) são eliminadas nas fezes do animal. Depois de penetrarem ativamente o hospedeiro intermediário, evoluem para larvas de segundo estádio (L2) e de terceiro estádio (L3), que constituem a forma infetante. Os caprinos infetam-se por ingestão de lesmas e caracóis contendo L3. Os parasitas adultos estabelecem-se no pulmão, onde as fêmeas depositam os ovos. As L1 são eliminadas com a expetoração, deglutidas e excretadas nas fezes, contaminando as pastagens.

A infeção por parasitas pulmonares pode ser assintomática ou resultar em doença clínica, caracterizada essencialmente por tosse. O diagnóstico faz-se através da análise das fezes, recorrendo à técnica de Baermann modificada, que consiste na recuperação das L1 das fezes e na sua identificação microscópica (Figura 2). A determinação da carga parasitária faz-se contando o número de larvas por grama de fezes (LPG).

A maioria dos nematodes gastrointestinais, nomeadamente os estrongilídeos, têm um ciclo de vida idêntico, sem intervenção de hospedeiros intermediários (ciclo direto). Os parasitas adultos vivem no trato gastrointestinal, onde as fêmeas põem ovos que são excretados nas fezes e, posteriormente, eclodem no meio ambiente. Os animais infetam-se por ingestão de larvas infetantes (L3) presentes na pastagem. A infeção por coccídeas (do género Eimeria) também é bastante frequente em caprinos, embora seja geralmente assintomática nos animais adultos. O diagnóstico das infeções por parasitárias gastrointestinais faz-se através do exame parasitológico das fezes, recorrendo a diversas técnicas. A carga parasitária determina-se através da contagem de ovos (no caso dos nematodes, cestodes e trematodes) ou oocistos (no caso das coccídeas) por grama de fezes (OPG/OoPG) (Figura 3).

A prevalência de parasitas pulmonares e gastrointestinais em caprinos na região Centro é elevada.

No âmbito do Projeto “Easy Baermann para realização in house” (PIPC/003/2022_02), INOV C+ foi determinada a prevalência de parasitas pulmonares e a carga parasitária em amostras fecais de 203 caprinos da região Centro. Obteve-se uma prevalência de infeção de 95,6% e uma carga parasitária média de 276,0 LPG, tendo-se identificado apenas parasitas da espécie Muellerius capillaris. As amostras fecais de 159 caprinos foram ainda estudadas quanto à presença de parasitas gastrointestinais. Observou-se uma prevalência de infeção de 93,2%, predominando os ovos do tipo estrongilídeo (87,8%) e os oocistos de Eimeria (68,9%), com cargas parasitárias médias de 518,0 OPG e 399,8 OoPG, respetivamente (Figura 4).

Este estudo permitiu observar uma carga parasitária particularmente elevadas para os parasitas pulmonares, com 16,5% dos animais apresentando mais de 500,0 LPG, sugerindo que a desparasitação anual é insuficiente para controlar a infeção. Alguns estudos têm apontado para a ineficácia terapêutica dos antiparasitários vulgarmente usados para as infeções parasitárias gastrointestinais nas infeções produzidas por parasitas pulmonares, particularmente M. capillaris. Assim, considerando os resultados obtidos, é urgente determinar o impacto económico e as repercussões na saúde animal das infeções por parasitas pulmonares, de forma a determinar a necessidade de instituir protocolos terapêuticos específicos para os animais com cargas parasitárias mais elevadas. Pode aceder ao artigo completo em https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/38672389/

O controlo antiparasitário assenta essencialmente na utilização de antiparasitários, o que conduz inevitavelmente à emergência de parasitas resistentes.

O controlo das infeções parasitárias assenta essencialmente na utilização de vários antiparasitários. No entanto, poucos produtos estão registados para utilização em caprinos.
A utilização de antiparasitários tem levado à emergência de resistências. No entanto, em Portugal os estudos são escassos, embora já tenham sido identificadas resistências aos antiparasitários em explorações mistas (ovinos e caprinos) na região de Lisboa. A investigação das resistências aos antiparasitários em pequenos ruminantes é fundamental, porque permitirá impulsionar a implementação de estratégias sustentáveis de controlo antiparasitário, que contribuam para prolongar a vida útil dos princípios ativos disponíveis no mercado (…).

→ Leia o artigo completo na Revista Voz do Campo: edição de julho 2024

Autoria: Maria de Aires Pereira1,2, Daniel Correia3, Fernando Esteves2, Teresa Letra Mateus4,5,6, Maria João Vila-Viçosa7,8, Rita Cruz5

1 Global Health and Tropical Medicine, GHTM, Associate Laboratory in Translation and Innovation Towards Global Health, LA-REAL, Instituto de Higiene e Medicina Tropical, IHMT, Universidade Nova de Lisboa
2CERNAS-IPV Research Centre, Instituto Politécnico de Viseu
3Cassepedro – Cooperativa Agro-Pecuária de S. Pedro do Sul
4Veterinary and Animal Research Centre (CECAV), UTAD, Associate Laboratory for Animal and Veterinary Sciences (AL4AnimalS)
5EpiUnit – Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, Laboratory for Integrative and Translational Research in Population Health (ITR)
6CISAS – Center for Research and Development in Agrifood Systems and Sustainability, Escola Superior Agrária, Instituto Politécnico de Viana do Castelo
7Laboratório de Parasitologia Victor Caeiro, Universidade de Évora
8MED, Instituto Mediterrâneo para a Agricultura, Ambiente e Desenvolvimento da Universidade de Évora