“Produtores perdem a sua oportunidade de produção caso não haja um apoio rápido do Governo”

A pera Rocha, um dos ícones da fruticultura portuguesa, enfrenta uma das suas piores crises. A ameaça é dupla: o fogo bacteriano, uma bactéria devastadora, e a estenfiliose, um fungo que causa podridão nos frutos.

Durante o Seminário Internacional – Aguardentes, Territórios e Sustentabilidade, que decorreu recentemente no âmbito do Aguardente DOC Fest Lourinhã, a equipa da Voz do Campo foi ao encontro de Miguel Guisado, produtor de aguardente de perada de pera Rocha – Old Nosey, em Aldeia da Serra (Turcifal), no concelho de Torres Vedras.

O produtor partilha que o fogo bacteriano já causou danos catastróficos em outros países, como a Itália, onde metade dos pomares foi comprometida, transformando um país exportador de peras em importador.

Em Portugal, o problema já afeta sobretudo os pomares mais modernos e intensivos, que apesar de tecnologicamente avançados, são mais vulneráveis.

Miguel Guisado, que cultiva 3,5 hectares de pomares tradicionais com árvores antigas em sequeiro, revela que a sua produção caiu cerca de 50% nos últimos anos. “Embora os sistemas antigos sejam mais resilientes, devido à rusticidade e aos porta-enxertos tradicionais como o Pé-Franco, as perdas são graves. Climas difíceis dos últimos dois anos agravaram ainda mais a situação”, afirma. A perda de produção não é apenas um problema agrícola, mas económico. “Se não houver pera Rocha, não há aguardente de perada, um produto premium derivado da pera (…). É uma situação muito complicada que está a afetar seriamente os rendimentos dos fruticultores da nossa região”, lamenta, destacando que a continuidade do setor depende do combate eficaz a estas doenças.

De acordo com o produtor, através das organizações de produtores como a Associação Nacional de Produtores de Pera Rocha (ANP) e a Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), têm alertado o Governo sobre a necessidade de investigação para encontrar formas de prevenir ou combater a doença e também apoios para conseguir replantar, ou, minimizar os efeitos, mas a resposta tem sido lenta.

A incapacidade de conter a devastação dos pomares levou muitos produtores a arrancar as árvores, substituindo-as por vinhas, macieiras ou até olivais. “Estou apreensivo porque se por um lado a pera estava a ser muito mal valorizada, já existia um grande problema em termos de rendimento onde os agricultores não tinham poder económico para investir e conseguir controlar ou minimizar estes efeitos, e agora perdem a sua oportunidade de produção caso não haja um apoio rápido por via das entidades governamentais”, remata Miguel Guisado.

A aguardente de perada

A aguardente de perada de pera Rocha é um exemplo de como os produtos tradicionais podem agregar valor. Miguel Guisado compara a perada à sidra de maçã: “A perada está para a pera como a sidra está para a maçã”. A aguardente de perada, diz o produtor, “é uma aguardente de fruta muito suave e aromática, com um intenso aroma de pera. Pode ser apreciada em cocktails, fresca, ou como digestivo. Além disso, tem aplicações gastronómicas, como flambar sobremesas ou carnes”. Embora seja um nicho de mercado, um produto premium, a aguardente de perada é uma forma de preservar o valor dos pomares tradicionais, que são menos suscetíveis às doenças.

Mais desenvolvimento sobre o Aguardente DOC Fest Lourinhã e o Seminário Internacional – Aguardentes, Territórios e Sustentabilidade na edição de Janeiro 2025 (brevemente em circulação).

→ Leia este e outros artigos completos na Revista Voz do Campo  edição de dezembro 2024, disponível no formato impresso e digital.

(Re)Veja aqui a reportagem completa do Seminário Internacional – Aguardentes, Territórios e Sustentabilidade: