Comunicado CNA:
No cumprimento do dever de defesa dos direitos dos agricultores que representa, predominantemente a pequena e média agricultura e os agricultores e agricultoras familiares que constituem mais de 90% das explorações agrícolas do país, a CNA – Confederação Nacional da Agricultura afirma que não “passa cheques em branco” e, por isso, não subscreveu o “Pacto para a Estabilização e Redução de Preços dos Bens Alimentares”.
Na origem da decisão da CNA estão razões que vão desde a ausência de um compromisso sério por parte do Governo em afrontar o poder da grande distribuição e dar resposta aos problemas que afectam a agricultura, até à quebra unilateral das negociações pelo Governo, que, a meio do processo, arredou da mesa das negociações a CNA e os parceiros sociais da PARCA – Plataforma de Acompanhamento das Relações na Cadeia Agroalimentar, para fechar um acordo “em directo” com apenas dois representantes dos sectores envolvidos.
A CNA, como sempre, assumiu este processo com toda a responsabilidade, e, na semana passada, sentou-se à mesa de negociações com o Ministério da Agricultura. Desde o primeiro momento fomos claros nas nossas reclamações e propostas, nomeadamente no que diz respeito ao funcionamento do mercado, manifestando total disponibilidade para discutir medidas. Lamentamos, por isso, que essa disponibilidade não se tenha verificado por parte do Governo.
O Ministério da Agricultura comprometeu-se a enviar à CNA os dados concretos da Ajudas distribuídas em 2022 (que deixaram de fora muitos pequenos médios agricultores) e as propostas de novas medidas para 2023, mas ainda hoje continuamos à espera desses documentos.
Até o Governo ter quebrado as negociações, ao limitar a assinatura do acordo a apenas duas entidades, a CNA apresentou propostas concretas para a regulação do mercado, para promover a justiça na distribuição de valor ao longo da cadeia agroalimentar, defender o rendimento dos agricultores e garantir uma alimentação acessível aos consumidores, medidas que temos reafirmado e tornado públicas.
Entre as medidas propostas pela CNA estão a regulação do mercado e dos preços, seja de produtos alimentares, seja de factores de produção, a compra conjunta desses factores de produção, a adopção de uma lei que proíba as vendas com prejuízos ao longo de toda a cadeia produtor-consumidor, a dinamização dos mercados locais ou a adopção de uma estratégia audaz de compras públicas que valorize a produção local e sustentável.
Da parte do Governo não houve abertura à negociação de medidas concretas que pudessem pôr em causa a hegemonia da grande distribuição.
Falámos, por exemplo, de uma proposta da CNA para isentar de IRS o subsídio de alimentação pago em dinheiro (actualmente 5,20€) para o mesmo limite aplicado ao cartão ou vale-refeição (8,32€). A proposta foi desde logo rejeitada, mostrando claramente de que lado está o Governo: incentiva o pagamento do subsídio em cartão, prejudicando o pequeno comércio e os agricultores que vendem em feiras e mercados, bem como a livre escolha dos consumidores, pois são maioritariamente as grandes cadeias de distribuição e alguns restaurantes que aceitam estes pagamentos.
O pacto assinado pelo Primeiro-Ministro, CAP e APED, para além de não responder às necessidades dos agricultores e de não garantir de forma cabal uma justa distribuição do valor ao longo de toda a fileira e assim garantir um preço acessível aos consumidores, incorpora ainda elementos de desconsideração pelos organismos oficialmente constituídos. Ao criar uma comissão de acompanhamento para um acordo onde se refere os preços dos produtos está a desrespeitar todo o trabalho realizado ao nível da PARCA, organismo que teria a legitimidade para o fazer. Mesmo a própria reprogramação do PEPAC em curso passará agora a ser discutida por esta comissão, entrando em claro conflito com a Comissão Nacional de Acompanhamento do PEPAC, também recentemente constituída e legalmente reconhecida.
O compromisso que assumimos perante o país é de continuarmos, como sempre, a lutar pela Agricultura Familiar, a exigir que sejam tomadas medidas justas que possam reduzir o esforço financeiro das famílias com a sua alimentação, com preços justos em toda a fileira, de forma permanente e não por apenas seis meses.