Acredita-se que por volta de 10.000 anos A.C. a humanidade deu início à prática da agricultura. Deveu-se à atividade agrícola a sedentarização do Homem junto aos cursos de água, tendo sido criadas as primeiras aldeias que originaram as cidades e civilizações. É inquestionável a importância da agricultura para o Homem, uma vez que lhe fornece alimentos e produtos medicinais, e, em particular, a produção de alimentos saudáveis, que não ocorrerá sem o uso sustentável de produtos fitofarmacêuticos e sem a garantia da segurança alimentar.
Contudo, cerca de 42% de pessoas no mundo não têm ainda acesso a uma alimentação adequada e saudável. Constata-se que em algumas zonas do globo são perdidos ou desperdiçados alimentos em quantidades consideráveis, incluindo os recursos que foram necessários para os produzir, como a terra, a água, a energia e o trabalho. Um relatório da WRI referia em 2010 que era necessário aumentar em 56% a produção alimentar até 2050 e a ONU alertava em 2012 para a necessidade deste aumento rondar os 50% (Figura 1).
Por outro lado, sabe-se que, pelo menos, 40% das perdas da produção global, se deve à ocorrência de estragos/prejuízos provocados por pragas e doenças. Este valor pode significativamente aumentar sob condições climáticas em mudança e com as novas ameaças que surgem devido ao aparecimento de insetos e patogéneos mais agressivos.
A intensificação do comércio internacional de produtos vegetais (sementes, plantas, parte de plantas, frutos ou derivados) continua, também, a promover a introdução de pragas e doenças exóticas em novas regiões fazendo aumentar a aplicação de produtos fitofarmacêuticos e a ameaça da segurança alimentar.
Num ambiente de mudança do clima, com a existência de fenómenos meteorológicos extremos cada vez mais frequentes e de maior intensidade, existe uma grande imprevisibilidade e incerteza quanto à capacidade de adaptação de certas pragas e doenças em áreas onde anteriormente não seriam capazes de se instalar, originando um aumento da pressão sobre as culturas, tanto no espaço como no tempo.
As alterações climáticas, além de prejudicarem a produção e a qualidade dos produtos agrícolas, fazem aumentar a quantidade de alimentos perdidos e desperdiçados ao longo das cadeias de abastecimento (causada por organismos nocivos que provocam a detioração dos produtos durante o armazenamento ou o transporte) o que faz ampliar as necessidades de introdução de mais produtos fitofarmacêuticos na cadeia alimentar.
O impacte ambiental da agricultura é o efeito que as diferentes práticas agrícolas têm nos ecossistemas que as rodeiam e que varia conforme as práticas utilizadas pelos agricultores e com a intensidade com que as mesmas são aplicadas. Só reconhecendo a forma como o clima afeta todas as partes das cadeias de valor agrícolas é que se poderá identificar «onde e como» se pode interferir para aumentar a resiliência climática, a segurança alimentar, a saúde e a prosperidade.
Apesar da implementação de vários instrumentos legislativos a nível comunitário, em particular da Estratégia para a Biodiversidade 2020, e da Diretiva do Uso Sustentável dos Pesticidas1 com a obrigatoriedade de implementação dos princípios gerais da Proteção integrada desde 2014 nos países da UE, as últimas avaliações sobre o estado da biodiversidade na Europa realizadas em 2020, indicam que os esforços dos Estados Membros foram insuficientes, constatando-se que as metas não foram alcançadas e que apenas 15% das avaliações de habitats no âmbito da Diretiva Habitats apresentam um bom estado (agravamento desde 2010), e que as pressões sobre os ecossistemas aumentam pelo crescente impacto das mudanças climáticas e das espécies exóticas e invasoras (COM, 2022).
A redução da biodiversidade, materializada em milhares de espécies de insetos e aves que tem vindo a desaparecer do ecossistema mundial, tem levado a que as substâncias ativas mais prejudiciais para os seres humanos, animais e, em especial para os polinizadores, como as abelhas, e para o ambiente, estejam a ser banidas da União Europeia. Promover a agrobiodiversidade nos sistemas de produção é um meio para aumentar a resiliência climática e a segurança alimentar no mundo.
Os agricultores enquanto guardiões do mundo rural, desempenham um papel vital na preservação da biodiversidade. Contudo, a adoção de certas práticas agrícolas, nomeadamente o uso intensivo de pesticidas, constituem uma das causas capitais de declínio da biodiversidade. É por esta razão que a sensibilização e formação dos agricultores se torna crucial para a adoção de práticas mais sustentáveis (…).
¹Diretiva 2009/128/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de outubro de 2009, que estabelece um quadro de ação a nível comunitário para uma utilização sustentável dos pesticidas.
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Outros temas serão desenvolvidos em «Saúde das plantas: os novos desafios para o ecossistema agroflorestal – Parte II»
Autoria: Esmeraldina Sousa¹, Miriam Cavaco¹, Isabel Calha¹, Edmundo Sousa¹
¹Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV, IP), Quinta do Marquês, Oeiras.
Contacto: esmeraldina.sousa@iniav.pt