Intervenção de Isménio Oliveira no Encontro “Bacia Hidrográfica do Rio Mondego. Que estratégias face às Alterações Climáticas e à Seca?” em Penela, promovido pelo Movimento MUNDA.

A água é um fator decisivo para a sustentabilidade da agricultura e dos territórios rurais. É um recurso estratégico e é na sua disponibilidade e gestão eficiente que está a chave da produtividade e da viabilidade das atividades agrícolas.

Assim, a CNA considera que a gestão da água não pode estar exclusivamente restrita ao factor preço. A água para a pequena e média agricultura, para a agricultura que produz alimentos e que por isso concorre para a Soberania Alimentar do País, deve ter um preço que permita a viabilidade económica das explorações, considerando que se reconhece a prestação de bens e serviços públicos, seja na garantia da segurança e soberania alimentar seja na manutenção do ciclo da água, na vitalidade dos solos, na garantia da biodiversidade para além do papel da vitalização económica e social dos territórios rurais.

É para nós fundamental que se invista nas infraestruturas de reserva e distribuição de água, nomeadamente na recuperação de regadio tradicional e mini-hídricas, nas ligações entre barragens e na execução plena do Programa Nacional de Regadios, em especial no Norte e Centro, tendo em conta as necessidades da Agricultura Familiar. Obviamente que a cada situação a sua análise e a devida solução técnica, mas esta deve ser uma prioridade para o Governo.

Em 2023, a CNA participou na Consulta Pública sobre o “Livro Branco do Regadio Público” e foi exatamente isto que defendemos, a necessidade de uma política para o regadio que dê prioridade às pequenas e médias explorações da Agricultura Familiar fundamentais para alcançar a soberania alimentar do país. E, para além disso, que critérios de hierarquização da utilização da água, especialmente em situação de contingência, considerem como absolutamente prioritário o abastecimento às populações também de alimentos e por isso da atividade agrícola.

Mas os investimentos no regadio não são necessariamente as grandes obras. São, por exemplo, pequenas obras de manutenção como é a intervenção urgente na região, especificamente no aproveitamento hidroagrícola do Baixo – Mondego. O Rio Pranto, que desagua no Rio Mondego, perto do Alqueidão – Figueira da Foz, quando há maré alta (como a sua cota é mais baixa que a do Mondego) as águas salgadas entram no Rio Pranto e afetam os campos de arroz. Esta situação faz com que as águas salgadas se infiltrem nos campos, com o arroz na floração queimado pelo sal e com os produtores a perderam 25% ou mais da sua produção anual, além dos atrasos que muitas vezes provocam na realização das culturas. A destruição das comportas que impediam a entrada de água salgada agravou o problema. A Obra de substituição/reabilitação das comportas da Maria da Mata e do Alvo é urgente e inadiável, como o próprio Ministério do Ambiente reconhece. Os agricultores do Vale do Pranto esperam medidas do Governo no sentido de que, durante este ano de 2024, as comportas da Maria da Mata sejam reconstruídas e as comportas do Alvo restauradas.

Para além disso, os agricultores do Vale do Mondego continuam à espera da finalização das Obras HidroAgrícolas que comportam redes de rega e enxugo. Continuam 40 anos depois à espera de que as promessas sejam cumpridas.

Falta finalizar o Emparcelamento em cerca de 4000 mil hectares envolvendo cerca de 2000 agricultores, nas áreas do   Vale do Pranto, vale do Ega, Vale do Arunca e Campos de Ançã e S. João do Campo. Este vales ficam nos concelhos de Soure, Figueira da Foz, Condeixa-a-Nova e Coimbra.

Para a resolução deste e de outros problemas e pela importância que a boa gestão da água tem para agricultura, para a região e para o País, é fundamental que o Ministério da agricultura em articulação com o Ministério do Ambiente tome medidas no sentido de:

  •  Garantir a água para o abastecimento da população, considerando também a água, e por tanto o investimento em infraestruturas de armazenamento e distribuição de água para a produção agrícola que produz alimentos.
  • Controlo de situação de cheia e gestão da qualidade da água, por exemplo na regularização do Rio Ega em 8,2 Km da foz para montante até á freguesia de Figueiró do Campo – Soure; no controlar o regime de caudal de forma haver um maior controlo de situação de cheia para as margens esquerda ou direita principalmente na zona habitacional. Esta situação obriga necessariamente à reversão das concessões e, também, a renacionalização do sector estratégico da energia.
  • Implementar com urgência a monitorização dos caudais e cotas da Barragem da Aguieira; há que aumentar as margens de segurança da barragem da Aguieira, para que não se repitam as tragédias que aconteceram com as cheias de 2001, 2016 e 2019
  • Aquando da ocorrência de prejuízos em resultado da inacção do Governo, este deve assumir a responsabilidade pelo pagamento dos prejuízos causados nas culturas, por exemplo pela invasão da água proveniente do rebentamento do rio Mondego aquando de cheias.
  • Tomar medidas de forma a permitir que as areias depositadas no Rio Mondego fluam sem obstáculos, de forma natural.
  • Promover medidas de gestão de água nos vales periféricos do Mondego, como a instalação de bombas para bombear a água dos vales periféricos para o Leito Principal, indispensáveis, para que os habitantes das localidades ribeirinhas não continuem a sofrer com a invasão da água nas suas habitações, como aconteceu em anos anteriores.
  • Promover medidas de manutenção nas estradas paralelas ao Rio Mondego (margem esquerda e margem direita). Falamos de estradas, desde Coimbra até à Figueira da Foz, uma intervenção que é mais que urgente!
  • Tomar medidas para evitar abatimentos nas margens do Rio Mondego como têm acontecido nos últimos anos.
  • Avançar com a prometida obra hidroagrícola e emparcelamento do Baixo Mondego, em especial nos Vales do Pranto, Arunda, Ega e S.Facundo/Ançã.
  •  Um estudo de Impacto Ambiental nos Vales do Pranto, Arunca, Ega e S. Facundo/Ançã;
  • Controlo na retirada de areia de montante para jusante do Açude de Coimbra, para não acontecer como em 2019 em que a retirada foi muito superior à capacidade do rio Mondego em caudais sólidos, originando que com esta enorme mobilização de inertes, que foram novamente       depositados no leito do rio a jusante do açude de Coimbra, a APA provocou um desequilíbrio dinâmico no leito do Rio Mondego, contribuindo decisivamente para o descontrole da capacidade de encaixe da água, acelerando o processo que deu origem às cheias. Falando em números, antes das cheias de 2019, foram retirados cerca de 800.000 M3 de areia de montante para jusante do Açude de Coimbra, quando a capacidade do rio em caudais sólidos por ano em Coimbra é de 295.000 M3.

São necessárias medidas do Ministério do Ambiente tendo em conta as propostas das populações e das Associações, para não termos de assistir à repetição de tragédias causada pelas cheias.

Porque a acontecer novamente, será única e exclusivamente responsabilidade do Governo, que não aprendeu com o passado recente, e não tomou as medidas necessárias.