ZERO e Oikos consideram que o tempo das declarações passou, a COP28 tem que ficar marcada pela concretização de ações decisivas.
A conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre o clima (COP28), que decorre de 30 de novembro a 12 de dezembro no Dubai, Emirados Árabes Unidos (EAU), é a 28.ª reunião anual da Conferência das Partes da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas (UNFCCC em inglês). Esta convenção vincula todos os países a mitigarem as alterações climáticas e encontrar uma forma de reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE) de uma forma equitativa e proporcional a cada país ou grupo de países (as Partes).
Num contexto de temperaturas globais recorde e de condições meteorológicas extremas em todo o mundo, nomeadamente na Europa na região do Mediterrâneo, incluindo incêndios florestais na Grécia e inundações na Líbia intensificadas pelo aquecimento global, a urgência de enfrentar a crise climática é mais premente do que nunca.
Os impactos climáticos estão a agravar vulnerabilidades, desigualdades e a privar as pessoas de uma vida com dignidade, devastando os nossos ecossistemas naturais, que são a linha de vida para a sobrevivência das pessoas. Estes impactos continuarão a aumentar exponencialmente. As pessoas do Sul Global, que pouco contribuíram para a crise climática, têm pago as consequências da ação insuficiente dos poluidores históricos ricos há várias décadas, e, no entanto, as emissões continuam a aumentar. A COP28 apresenta uma oportunidade para esta correção de rumo, especialmente sob a forma da Avaliação Global (“Global Stocktake”).
Neste contexto, é importante salientar que a cada ano que passa de inação e de promessas não cumpridas, perdemos a oportunidade de evitar as piores consequências das alterações climáticas e que serão mais acentuadas nos países com menor capacidade de resposta. A verdade é que os países ricos têm falhado continuamente em cumprir as suas promessas financeiras, enquanto as tensões geopolíticas têm sido usadas como desculpa para recuar no compromisso de mitigação de alguns países. É por isso que na COP28 é fundamental que as Partes trabalhem no sentido de manter vivo o Acordo de Paris, e as negociações devem demonstrar claramente o sentido apropriado de urgência e solidariedade em torno da crise climática.
Temas fundamentais na COP28
Na COP28, esperamos que as Partes alcancem progressos substanciais para uma transição justa e equitativa para a eliminação progressiva dos combustíveis fósseis, na expansão sustentável das energias renováveis, no financiamento climático e para enfrentar as Perdas e Danos. Neste sentido, serão apresentados alguns temas chaves das negociações.
Balanço dos esforços climáticos
O Acordo de Paris exige uma avaliação periódica da ação climática global, chamada Global Stocktake (GST). O processo de cinco anos envolveu cientistas, atores institucionais e o setor privado através da We Mean Business Coalition. O seu principal objetivo é facilitar a avaliação do progresso contínuo e impulsionar compromissos mais ambiciosos. O GST a ser adotado no Dubai centrar-se-á em três domínios principais: mitigação, adaptação e financiamento climático. Como as Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC), atualizadas em Glasgow, não conseguiram conduzir a comunidade global no caminho certo para cumprir as suas metas para limitar o aumento global de temperatura, os resultados do GST estão preparados para um escrutínio intenso. Assim que o GST estiver concluído, os países terão dois anos para rever as suas NDC. No entanto, a forma como o GST será enquadrado na COP28 será importante para avançar com a ação climática nos próximos anos. A COP28 deve transmitir aos governos, às empresas e aos mercados financeiros a importância de uma melhor integração das considerações climáticas na tomada de decisões económicas e financeiras públicas e privadas.
Mitigação: eliminação progressiva dos combustíveis fósseis e metas globais para energias renováveis e eficiência energética
À medida que as temperaturas continuam a subir em todo o mundo, são necessárias ações concretas – e não apenas retórica. Apelar à eliminação progressiva dos combustíveis fósseis não reduzidos (unabated, em inglês), em vez de uma eliminação progressiva total de todos os combustíveis fósseis, deixa lacunas abertas para a continuação da utilização de combustíveis fósseis. Na COP28, alinhadas com o limite de aumento temperatura de 1,5°C até 2050, todas as Partes deverão concordar com uma eliminação global rápida, justa e equitativa dos combustíveis fósseis em todos os setores até 2050, o mais tardar, o que deverá ser acompanhado de uma rápida expansão das energias renováveis e de maiores esforços em termos de eficiência energética. Para a União Europeia (UE), isto significa que o carvão deve ser eliminado o mais tardar até 2030, o gás fóssil o mais tardar até 2035 e o petróleo o mais tardar até 2040.
As necessidades globais incluem um crescimento anual de 1,5 Terawatt (1500 GW) de nova capacidade produtiva de energia renovável limpa, alinhada com o objetivo de mais que triplicar a capacidade global de produção de energia renovável até 2030 (tomando a produção de 2022 como valor base). Os países devem comprometer-se a melhorar as suas NDC e os seus planos de financiamento para um processo nacional, equitativo e participativo para as suas próprias quotas justas para as metas globais, de forma a cumprir o objetivo de limitar o aquecimento a 1,5°C.
Financiamento climático e Transformação do Sistema Financeiro
A atual arquitetura financeira internacional não é adequada para enfrentar a crise climática. Existe uma lacuna crescente entre as necessidades de financiamento climático dos países em desenvolvimento e a atual escala, suficiência e acesso ao financiamento climático. Os países desenvolvidos, especialmente a UE, devem cumprir integralmente o compromisso anual de longa data de financiamento climático de 100 mil milhões de dólares: a UE deve liderar pelo exemplo, fornecendo financiamento novo e adicional, com foco no aumento de subvenções para adaptação, para colmatar as lacunas existentes e fortalecer a ação climática global. Para o futuro objetivo de financiamento climático, agora em negociação, a UE deve desempenhar um papel mais construtivo, apoiar progressos decisivos na COP28 e um objetivo que reflita as necessidades dos países em desenvolvimento e a ciência, incluindo sub-objetivos para mitigação, adaptação e perda e danos, assente num núcleo de financiamento público.
Adaptação
Além da maior exposição e sensibilidade às alterações climáticas, os países em desenvolvimento têm uma capacidade de adaptação limitada que os torna particularmente vulneráveis às alterações climáticas. O défice de adaptação é cada vez mais o foco dos países em desenvolvimento nas negociações sobre o clima. O financiamento da adaptação é difícil, uma vez que os projetos não criam necessariamente boas oportunidades de negócio e, portanto, não atraem capital privado na mesma medida que alguns projetos de mitigação. Na verdade, os projetos de mitigação são, de longe, os maiores beneficiários do financiamento climático. Na COP27, apesar da resistência inicial, a conferência manteve o compromisso de Glasgow de duplicar o financiamento da adaptação, promovendo contribuições adicionais para o desenvolvimento de fundos nacionais. O lançamento da Agenda de Adaptação de Sharm-El-Sheikh estabeleceu um modelo para medidas abrangentes de adaptação global em setores-chave.
Uma das fortes exigências para a COP28 seria a adoção do Objetivo Global de Adaptação, que oferecerá um quadro internacional de adaptação, definindo objetivos e indicadores para monitorizar e quantificar o progresso. As discussões sobre adaptação enfrentaram obstáculos na questão do financiamento e como medir a adaptação. Avaliar o capital natural de um determinado ecossistema ou o nível de resiliência de uma comunidade aos choques climáticos ainda constitui um desafio. O nível de flexibilidade em torno do novo quadro de adaptação já vem sendo debatido há muito tempo e continuará a ser na COP28.
Perdas e Danos
O Fundo de Perdas e Danos teve uma vitória histórica na COP27. Apesar das fortes resistências iniciais dos países em desenvolvimento, estes acabaram por apoiar as recomendações do comité de transição que propõem que o fundo seja gerido pelo Banco Mundial. Agora é fundamental garantir que o fundo respeite os princípios da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas e do Acordo de Paris e as obrigações em matéria de direitos humanos, que os recursos financeiros estejam disponíveis para as comunidades que precisem e com fácil acesso. Este é o momento de operacionalizar o fundo e os países desenvolvidos devem liderar o pagamento de subvenções. Na COP28, a UE e os seus Estados-Membros devem desempenhar um papel proativo, garantindo que o fundo aborda as preocupações de justiça climática e de direitos humanos e que está sob a autoridade e orientação das Partes na Convenção e no Acordo de Paris. A UE e os Estados-Membros devem assumir compromissos substanciais e plurianuais para o Fundo de Perdas e Danos, fornecendo financiamento público novo e adicional em subvenções.
Alimentação e agricultura
A Ministra das Alterações Climáticas e do Ambiente, Mariam Almheiri, dos EAU anunciou durante o verão que esta presidência da COP estará “com o foco máximo” nos sistemas alimentares. Existe uma atenção crescente sobre o tema desde a COP27, em parte graças à publicação de um estudo na revista Nature que estima que os sistemas alimentares são responsáveis por 34% das emissões globais de GEE. As negociações envolverão a decisão sobre um plano de três anos, temas para workshops e uma estrutura de governança para o trabalho conjunto de Sharm El Sheikh sobre implementação de ação na Agricultura e Segurança Alimentar. Além da agroecologia, pescas e cooperação, sinergias e comunicação serão os temas principais.
E qual o papel da União Europeia?
O papel da Europa situa-se na encruzilhada da retórica e da realidade. Com ideias progressivas, mas que muitas vezes não são traduzidas em ações efetivas. A União Europeia (UE) negoceia na COP como um bloco de países poderosos e desenvolvidos. Com uma série de recomendações a serem apresentadas, a União Europeia irá apelar para o fim de todos os subsídios — diretos e indiretos — aos fósseis, “assim que possível e o mais tardar até 2025”. A UE também apoia um objetivo global de triplicar as fontes renováveis de energia e duplicar a eficiência energética até 2030, em conjunto com a eliminação progressiva e tangível das fontes fósseis o mais rapidamente possível.
Nesta COP, a UE precisa de honrar os seus compromissos com a justiça ambiental internacional e ter os direitos humanos e a participação da Sociedade Civil Organizada no centro das negociações. A UE deve procurar construir alianças mais fortes com os países parceiros, especialmente os mais vulneráveis às alterações climáticas, através de abordagens equitativas ao balanço global, aos objetivos de mitigação e energéticos, às perdas e danos, à adaptação e ao financiamento, e procurar sinergias entre eles.
Chegou a hora da UE cumprir o que promete, ultrapassar as sombras dos interesses conflituantes, demonstrar uma liderança em linha com as suas responsabilidades e capacidades históricas e traçar um caminho alinhado com a equidade global e a urgência exigida pela ciência.
Portugal na COP28
Apesar das dificuldades apresentadas no contexto político atual, o país contará com a presença do Primeiro Ministro António Costa, do Ministro do Ambiente e Ação Climática Duarte Cordeiro, Secretários de Estado do Ministério do Ambiente e Ação Climática (presentes ao longo de toda a COP28 em função dos dias temáticos), além de Deputados de todos os grupos parlamentares e Presidente da Comissão de Ambiente e Energia e a relatora do Parlamento Europeu para a COP28, a Eurodeputada Lídia Pereira.
Portugal terá um pavilhão pela primeira vez em representação do país numa COP. O espaço será utilizado para a partilha de experiências e resultados nacionais na área da transição energética, da mobilidade e da biodiversidade. Como Estado-membro da União Europeia, Portugal deverá apoiar as negociações para que ações concentradas nos temas fundamentais avancem e para manter o objetivo do Acordo de Paris vivo.
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