I – O efetivo

Com efetivos mundiais superiores a um bilião de animais (1,28 e 1,11*106, respetivamente para ovinos e caprinos) (FAO, 2021), apresentam reduzida representação no espaço da UE (59 e 11,2M, respetivamente para ovinos e caprinos) e ainda menos significativa, de 2,2M e 352m de ovinos e caprinos, respetivamente, em Portugal (Eurostat, 2022).

Nas últimas duas décadas, verificou-se uma redução acentuada da população animal em toda a UE, particularmente nos ovinos e caprinos, cerca de 20 %, tendência que se mantém entre 2021 e 2022 – ovinos (2,4 %) e caprinos (4,1 %).

Em Portugal, ao longo do período 2009-2019, os ovinos diminuíram a sua produção (-0,2%/ano, de 2,22M para 2,18M), tendo os ovinos de carne, que representam 87% do efetivo, crescido 6% na última década, e os ovinos de leite decrescido 35%. Nesse período, o efetivo de caprinos decresceu significativamente, passando de 421m para 372m animais (-11%).

A evolução dos índices de preços na produção da produção animal na UE, de 2015-2022 revela uma estabilidade relativa, um crescimento em 2020, aumentando a um ritmo mais rápido em 2021 e 2022. Idêntica evolução se observou em Portugal, com um aumento na última década de 139% do volume de negócios.


II – Os produtos

Animais vivos

Com a abertura do mercado de exportação para Israel, tem existido um incremento significativo de exportação de animais vivos, mais 8,3% em 2022, tal como o volume de carne (+29,6%), sobretudo para países da UE. Teve como repercussão preços médios superiores (mais 13,7%) no ano anterior.

Carne de ovino e caprino

Verifica-se, desde 2007, um decréscimo acentuado na produção de carne de ovino e caprino na UE, com valores de 500m de toneladas de carne de ovino e caprino em 2022, em que a carne de ovino representa a grande maioria (cerca de 90 %) da produção total combinada. Três quartos da carne de ovino da UE em 2022 foram produzidas em Espanha (27,8 %), França (18,2 %), Irlanda (14,5 %) e Grécia (14,3 %). Entre os países da UE, os principais produtores de carne de caprino são a Grécia e Espanha .

Em Portugal, a produção de carnes de pequenos ruminantes em 2022 registou uma redução nos ovinos (-7,1%), não tendo ultrapassado as 14,8 m toneladas, mas um aumento nos caprinos (+4,9%), com 1,3m toneladas produzidas. A produção de carne de ovino diminuiu cerca de 20% na última década, e quanto a caprinos, nos últimos dez anos, constatou-se uma redução de 28%. O consumo de carne de ovino e caprino tem-se mantido constante a longo dos últimos anos (2,3 kg/habitante/ano), tendo a produção, em 2022, preenchido 91,7% das necessidades do mercado.

Produção de leite de ovino e caprino

A produção de leite de ovelha e cabra é particularmente direcionada, na UE, para transformação e reveste, apenas, particular relevância (pela sua proporção) na Grécia e Chipre.

Em Portugal, a produção de leite de ovinos e caprinos representa, em 2022, menos de 5% do leite total (1969M l), correspondendo o leite de ovelha a 69,5M l (- 2,4%, de 2021) e o de cabra a 28,9M l (- 2,7%). Quanto à produção de queijo, a produção total a nível nacional cresceu 1,0%, tendo atingido as 90 mil toneladas, apesar do decréscimo da produção dos queijos de ovelha (11,6 mil toneladas) e cabra (4,1 mil toneladas), 2,4% e 2,7% respetivamente.

Produtos Qualificados

Desde 1996, um significativo número de produtos tem sido qualificado como IPG ou DOP, quer relativamente a carne (5 DOP e 10 IGP), quer a produtos lácteos (10 DOP e 1 IGP), sendo preocupante o uso reduzido destas qualificações, particularmente em carne (0 certificações em 8 produtos, no intervalo de 2010-2019).


III – O Diagnóstico

Diagnóstico Social

Cerca de 30% (perto de 56 milhões de hectares) das áreas agrícolas da União Europeia (UE27) corre um risco moderado de deixar a terra e o abandono pode chegar a 5 milhões de hectares em 2030 e 2,9% da Superfície Agricultura Útil Atual (173 milhões de hectares)], a que acresce, em Portugal, o declínio demográfico e o elevado índice de envelhecimento da população (183,5% em 2022), condicionando fortemente, assim, uma produção maioritariamente localizada em zonas de interior e/ou de montanha.

O abandono e envelhecimento da população agrícola (na UE, em 2016, por cada agricultor com menos de 35 anos de idade havia mais de seis agricultores com idade superior a 65 anos) mais acentuado em Portugal (em 2019, por cada agricultor com menos de 35 anos de idade havia mais de dezoito agricultores com idade superior a 65 anos) e a pouca atratividade salarial (-19,9% do similar com mesmas qualificações) a uma preocupante ausência de mão-de-obra disponível e qualificada e, consequentemente, a uma pouca inovação do sistema e produtos que criem mais valor.

A reduzida capacidade organizativa, o número diverso de organização de produtores e sua vocação prioritária para a conservação e melhoramento genético das populações autóctones, uma ausência de abordagem de comercialização e marketing, têm, igualmente, condicionado o desenvolvimento da produção de pequenos ruminantes.

Diagnóstico Produtivo

Observa-se, num diagnóstico direcionado ao sistema produtivo, uma redução do efetivo muito acentuada nas últimas décadas, mantendo-se alguma estabilidade nos últimos anos. O facto de Portugal se encontrar no Espaço Europeu e integrado numa competitividade regional, num mundo mais global, dá uma menor importância proporcional a estas produções, sobretudo em contexto europeu, mesmo apresentando, durante as duas últimas décadas, semelhantes tendências de decréscimo populacional.

O consumo dos seus produtos é reduzido, com alguma estabilidade (carne) ou em decréscimo (queijo), apresentando pouco significado os produtos qualificados (carne) apresentado a necessitar de maior dinâmica e notoriedade.

A lã, outrora com interesse económico, é, de forma geral, considerada um custo/problema.

A comercialização dos animais vivos, com exceção sobretudo dos animais para exportação, ainda tem muito de sistema Informal ou de reduzida organização, o que explica a não qualificação de diversos produtos com denominação de origem.


IV – A Estratégia – uma Proposta

Estratégias Produtivas

O reconhecimento da relevância de um património único, o das raças autóctones e, consequentemente dos seus produtos, um papel mais ativo das Associações em toda a cadeia produtiva e no circuito comercial, é determinante, em estratégias de conservação e biodiversidade, para que os consumidores associem e reconheçam biodiversidade, recursos endógenos, bem-estar animal. Induz, nos consumidores e cidadãos, uma WTP (willingness-to-pay) para o programa de conservação, impulsionada pela responsabilidade do contribuinte na conservação, bem como dos produtos associados a essa mesma percetível responsabilidade. Permite, ainda, uma maior identidade e reconhecimento do território, contribuindo para minimizar o êxodo rural e favorecendo dinâmicas sociais e empresariais locais.

O uso multifuncional de pequenos ruminantes, como a limpeza de áreas agrícolas ou florestais, o seu papel na agricultura regenerativa e a sua relevância nos sistemas agroecológicos, na produção de matéria azotada ou em pastagens com contributo para a fixação de carbono, deve ser mais estimulado e apoiado, quer através do conhecimento quer por incentivos financeiros.

Toda a ligação ao mundo académico e à introdução de novas tecnologias, seja na produção seja no agroalimentar, ou mesmo na comercialização e marketing é determinante para a maior valorização da cadeia produtiva.

Estratégias Comerciais

O reconhecimento intrínseco da qualidade como identidade do produto, pelo seu sistema de produção, tipicidade, respeito pelas regras ambientais e de bem-estar, é determinante para o posicionamento dos produtos e o esforço (WTP) que deve ser solicitado ao consumidor. Para tal, estruturas de comercialização mais eficazes, com estratégias de comunicação e marketing bem precisas, são fundamentais para maior notoriedade e reconhecimento a estes produtos.

Uma maior simbiose entre o Território e a sua Gastronomia é fundamental e necessária, como forma de integrar e dar a conhecer todo o património da região, mas também como contributo para a redução da pegada de carbono. Neste contexto, dada a importância da qualificação dos produtos, torna-se necessário rever e repensar a atual estratégia, de forma que seja igualmente atrativo para os produtores e consumidores.

Políticas Públicas

Muitas das políticas que suportam este setor, enquadram-se dentro da PAC e, como tal, devem ser bem ajustadas à realidade portuguesa, quando da elaboração do seu Plano Específico, e aqui, de forma especial as que protegem os recursos genéticos, estimulam a produção, transformação, comercialização e qualificação dos produtos, promovem biodiversidade numa estratégia de preservação dos recursos naturais.

Outras, suportadas no território, deveriam estimular a integração deste Património na identidade do Território, nomeadamente pela valorização paisagística ou pela riqueza gastronómica, sinónimo de coesão territorial, combate à desertificação e rejuvenescimento da população agrícola, estímulo empreendedor para novos negócios e integração de mais valor e conhecimento na região.

Não menos relevante é o contributo para um equilíbrio da balança alimentar e a disponibilização de alimentos saudáveis, de qualidade e que contribuam para estratégias que promovam os circuitos curtos, a redução de pegada de carbono, mas, que acima de tudo, reconheçam a produção local e/ou nacional. Temos coragem para proteger e construir o Futuro?

Autoria:

Nuno Vieira – Professor Catedrático – Coordenador Mestrado Integrado em Medicina Veterinária

IUCS – Instituto Universitário de Ciências da Saúde

Fotografias:

© Manuel Correia. Arquivo Câmara Municipal de Cabeceiras de Basto [Casa da Lã – Bucos]

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