A grande maioria dos solos em Portugal são ácidos, desconhecendo-se em rigor de que forma o pH do solo e/ou a sua correção afetam o crescimento das plantas.

Neste estudo corrigiu-se o pH de dois solos muito ácidos e avaliou-se a resposta das plantas. As plantas evidenciaram deficiência severa de boro e um crescimento muito inferior ao das plantas que foram cultivadas nos mesmos solos, cujo pH não foi corrigido. Talvez, por isso, valha a pena ler este artigo.

A acidez do solo no mundo

A acidez do solo é um fator ecológico que influencia a produtividade das culturas um pouco por todo o mundo. Estima-se que a acidez do solo afete aproximadamente 50% dos solos com potencial de cultivo [1]. Para fins agrícolas, consideram-se solos ácidos aqueles que apresentam pH abaixo de 5,5 na maior parte do ano [2].

A acidez do solo tem origem em processos naturais, ocorrendo com elevada prevalência em regiões onde, pelo menos numa parte do ano, a precipitação excede largamente a evapotranspiração. Nestas situações, os catiões alcalinos, como cálcio, magnésio, potássio e sódio, são lixiviados do solo e substituídos por iões hidrogénio e alumínio [3]. O cultivo contínuo também pode aumentar a acidez do solo, na medida em que são absorvidos mais catiões que aniões e são libertados iões hidrogénio para a solução do solo para manter o balanço de cargas na planta [4].

A acidez do solo pode afetar o crescimento das plantas, primariamente pela toxicidade de alumínio e/ou de manganês. Adicionalmente, os solos ácidos podem estar associados a deficiente fornecimento de cálcio, magnésio e fósforo às plantas, sendo que a acidez do solo influencia a disponibilidade de muitos outros nutrientes essenciais como molibdénio, ferro, zinco e cobre [4].

A acidez em Portugal

Em Portugal estima-se que 80% dos solos sejam ácidos [5]. Contudo, pouco se sabe a que nível a acidez do solo afeta a produtividade das culturas. Os laboratórios de análises tendem a recomendar a aplicação de calcário quando o pH é ácido. Contudo, é discutível a partir de que nível de acidez se deve recomendar a correção e que nível de pH deve ser atingido. Pouco ou nada se sabe sobre a sensibilidade das espécies, e ainda menos das diferentes cultivares, ao pH e a sua resposta à correção do solo.

No interior norte de Portugal, cultivam-se, no presente, sobretudo espécies arbustivas e arbóreas, com destaque para videira, oliveira, amendoeira e castanheiro, cuja relevância depende sobretudo da altitude do lugar. Todas estas culturas têm uma tradição ancestral de cultivo na região, muito antes de se usarem corretivos ou fertilizantes minerais. Os materiais vegetais cultivados, isto é, as variedades regionais são, por certo, muito tolerantes à acidez do solo. Contudo, nos anos recentes assistiu-se a uma mudança de paradigma, com instalação de muitas plantações com porta-enxertos e variedades exóticos na região, sendo expectável que a acidez do solo e outras variáveis ambientais ganhem uma maior importância nos processos de cultivo.

Delineamento experimental

Foi realizado um estudo com dois solos muito ácidos, provenientes das duas principais formações litológicas do interior norte de Portugal (Xisto e Granito). Ambos os solos são Leptossolos dístricos. O solo de xisto é de textura franco-arenosa, com pH 4,53 e teor de carbono orgânico de 7,3 g kg-1. O solo de granito é de textura arenosa, com pH 4,86 e teor de carbono orgânico de 1,8 g kg-1.

No estudo foi usada uma variedade de oliveira local, a Cobrançosa, reconhecidamente como bem-adaptada a solos ácidos, e a Arbequina, habitualmente cultivada em solos neutros a alcalinos.

Constituíram-se cinco tratamentos fertilizantes, designadamente: carbonato de cálcio e óxido de magnésio (CalMg), para elevar o pH do solo; fósforo (+P); boro (+B); todos os fertilizantes referidos, i.e., testemunha positiva (Tes+); e sem aplicação de fertilizantes, i.e., testemunha negativa (Tes-). O ensaio decorreu em vasos, durante dois anos, nas estufas do Instituto Politécnico de Bragança.

Resultados e discussão

Quadro 1. Produção média de matéria seca de nas diferentes partes da planta das variedades Cobrançosa e Arbequina (parte extraída de um fatorial cultivar × solo × tratamento).

A produção total de matéria seca não variou significativamente entre as cultivares (Quadro 1). A Arbequina apresentou maior biomassa radicular e a Cobrançosa produziu frutos no segundo ano. A Cobrançosa é uma cultivar de maior porte que a Arbequina, sendo esta considerada de elevada precocidade [6]. É de realçar que a Cobrançosa, para além de produzir biomassa total em nível equivalente à Arbequina, foi ainda mais precoce, sendo talvez estas características que a tornam tão popular em algumas regiões de Trás-os-Montes (…).

Autoria: Manuel Ângelo Rodrigues1*, Soraia Raimundo1, Nuno Conceição1, José Moutinho-Pereira2, Carlos Manuel Correia2 e Margarida Arrobas1

1CIMO/SusTEC – Instituto Politécnico de Bragança

2CITAB – Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro 

*Correspondência: angelor@ipb.pt

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