A crescente pressão sobre os recursos hídricos e a necessidade de aumentar a eficiência da produção agrícola tornam imperativo o desenvolvimento de novas soluções tecnológicas na gestão da rega. Na cultura do arroz, tradicionalmente associada a elevados consumos de água, esta realidade é ainda mais desafiante.
Consciente deste cenário, o COTArroz – Centro Operativo e Tecnológico do Arroz tem vindo a apostar na experimentação e validação de métodos inovadores que permitam uma utilização mais eficiente e sustentável da água, sem comprometer o rendimento nem a qualidade do arroz nacional. Entre essas ferramentas destacam-se as sondas de monitorização de humidade do solo, cuja aplicação na orizicultura abre novas possibilidades para uma rega mais precisa, ajustada às reais necessidades da planta.
Este trabalho tem como objetivo apresentar alguns dos métodos com a utilização de sondas de rega em campos de arroz, demonstrando o seu potencial para reduzir desperdícios, melhorar a produtividade e contribuir para uma agricultura mais resiliente às alterações climáticas. Ao integrar tecnologia e conhecimento agronómico, o COTArroz reforça o seu compromisso com a inovação, sustentabilidade e competitividade da fileira do arroz em Portugal.
Esta ação foi desenvolvida no âmbito do PDR2020-2.1.4 – INFOARROZ
A Importância da Água e das Tecnologias de Monitorização na Cultura do Arroz em Portugal
A água desempenha um papel crucial na agricultura porque é indispensável para o crescimento das plantas. Sem água suficiente, as culturas não se desenvolvem adequadamente, o que reduz a produção de alimentos. Portanto, o acesso à água contribui diretamente para a segurança alimentar. A agricultura é, a nível mundial, um dos setores que mais consome água, sendo a irrigação responsável por uma parte significativa desse consumo.
Em Portugal, onde predomina um clima mediterrânico acentuado, a disponibilidade hídrica assume uma importância crítica para os sistemas agrícolas. Assim, a sua utilização racional e gestão eficiente representam desafios fundamentais para a sustentabilidade e o desenvolvimento da agricultura nacional.
Hoje em dia, na cultura do arroz, a água é utilizada de forma eficiente e cuidada. É utilizada não só para fornecer às plantas as suas necessidades hídricas, mas também como elemento regulador térmico. Tem ainda um papel essencial no apoio ao combate das infestantes, contribuindo para a redução dos químicos usados para o seu controlo.
A implementação de novas tecnologias e o desenvolvimento de novos métodos de cultivo permitiram que ao longo dos últimos 60 anos se tenha conseguido uma redução na utilização de cerca de 50% do volume de água.
Com o objetivo de ajudar o setor do arroz a tornar-se cada vez mais eficiente na utilização da sua água, o COTARROZ, ao longo dos últimos três anos procedeu à instalação de sondas de rega nos seus campos experimentais. Estes equipamentos, para além de permitirem a medição do teor de humidade nos canteiros de arroz (altura da lâmina de água), permitem também os registos horários da temperatura, tanto abaixo como acima do solo até 50 cm de altura, o que permite um acompanhamento mais completo das condições do solo e do clima ao longo de toda a campanha.
Durante todo o ciclo da cultura, para além da utilização de sondas de humidade do solo, foram utilizados dispositivos de monitorização remota, como as imagens NDVI (Índice de Vegetação por Diferença Normalizada), que possibilitam uma avaliação do estado fisiológico das plantas. Este sistema integrado proporcionou uma monitorização remota e contínua, facilitando a gestão da rega de forma mais precisa e eficiente e apoiando a tomada das diferentes decisões agronómicas ao longo do ciclo da cultura.
As sondas de humidade, ou sensores de humidade, revelaram-se ferramentas inovadoras para a cultura do arroz, permitindo:
- Medição da altura do nível da água nos canteiros.
- Monitorização das diferentes fases fenológicas da cultura do arroz.
- Possibilidade de previsão de surtos de piriculariose, através da análise das condições ambientais favoráveis ao desenvolvimento do fungo.
Medição da altura do nível da água
A medição da altura do nível da água nos canteiros de arroz revelou-se uma ferramenta extremamente útil no contexto da gestão da rega. Através dos equipamentos instalados nos campos e integrados em sistemas de monitorização remota, tornou-se possível acompanhar em tempo real as variações do nível da lâmina de água presente sobre o solo. Esta monitorização contínua permitiu detetar de forma rápida e precisa as eventuais reduções no nível da água no canteiro — alterações que, em muitos casos, podem estar associadas a ruturas nas marachas (pequenos diques que delimitam os canteiros). Essas falhas estruturais, embora possam parecer pontuais, têm um impacto significativo na eficiência do sistema de rega. Quando não são detetadas atempadamente, resultam em perdas significativas de água, comprometendo não só a sustentabilidade do uso hídrico, como também a sanidade da cultura.
Para além do desperdício de água, as quebras das marachas provocam um desequilíbrio térmico no ecossistema dos canteiros. A água, ao atuar como regulador térmico, ajuda a manter temperaturas mais estáveis junto às plantas. A sua ausência súbita pode causar oscilações de temperatura indesejadas, especialmente prejudiciais em fases críticas do desenvolvimento da cultura (Fig. 1), como a floração, período particularmente sensível ao stress térmico e hídrico. Nessa fase, a perda de água pode comprometer diretamente o rendimento e a qualidade da produção.

Assim, a capacidade de detetar remotamente estas oscilações no nível da água representa uma mais-valia significativa. Para além de permitir uma resposta rápida e localizada, evita-se a necessidade de vigilância constante no terreno, reduzindo custos operacionais e melhorando a eficiência da gestão agrícola. A integração desta ferramenta em estratégias de agricultura de precisão contribui não apenas para a sustentabilidade ambiental da cultura do arroz, mas também para a sua viabilidade económica a médio e longo prazo.
Monitorização das fases fenológicas da cultura do arroz com NDVI e Graus-Dia Acumulados
Ao longo de todo o ciclo da cultura do arroz, a análise da relação entre os Graus-Dia Acumulados (GDA) e o Índice de Vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) permitiu distinguir de maneira clara e objetiva as diferentes fases fenológicas da planta, nomeadamente a fase vegetativa, a fase reprodutiva e a fase de maturação (Fig. 2).
Os Graus-Dia Acumulados são uma métrica agrometeorológica usada para estimar o desenvolvimento das culturas em função da temperatura ao longo do tempo. A ideia base é que o crescimento das plantas depende da temperatura, e que cada espécie vegetal possui uma temperatura base abaixo da qual o crescimento é nulo.
Através da recolha e análise gráfica de dados que correlacionam o NDVI e os GDA, torna-se possível identificar os momentos em que a planta entra em transições fisiológicas marcantes. O NDVI, é utilizado para estimar a atividade fotossintética e a densidade da vegetação a partir da análise da reflectância da luz, aumentando à medida que a cultura se desenvolve na fase vegetativa. O NDVI atinge um pico no início da fase reprodutiva (associado à máxima cobertura foliar e atividade metabólica), e posteriormente começa a decrescer na fase de maturação, quando ocorre a senescência das folhas (Fig. 2).

Este tipo de monitorização permite prever com maior precisão os momentos ideais para práticas agrícolas específicas, como adubações, aplicações de produtos fitossanitários e colheita.
De forma a validar o número de GDA, ao longo de todo o ciclo da cultura, o COTArroz fez um acompanhamento contínuo dos estados fenológicos das plantas de arroz. Ao longo dos últimos três anos, verificaram-se os seguintes valores: A integração entre NDVI e GDA oferece uma abordagem poderosa para a monitorização do estado fenológico da cultura do arroz, permitindo uma gestão mais precisa e eficiente. A utilização destes indicadores contribui para a agricultura de precisão, reduzindo incertezas, otimizando recursos e aumentando o rendimento e qualidade final do produto.
Possibilidade de previsão de surtos de piriculariose na cultura do arroz
A piriculariose do arroz, causada pelo fungo Magnaporthe oryzae, é uma das doenças que mais afeta esta cultura a nível mundial. Em condições favoráveis ao fungo, pode causar perdas acentuadas de produtividade, afetando folhas, colmos, panículas e grãos. O controlo desta doença é, portanto, essencial para garantir uma boa produtividade da cultura e uma boa qualidade do grão.
Com as novas tecnologias de monitorização de dados agrometeorológicos é já possível a criação de modelos que preveem o risco de surtos de piriculariose.
Através da recolha de dados meteorológicos, com estações meteorológicas instaladas nos campos, é possível recolher dados como a temperatura do ar, a humidade relativa, a precipitação, a radiação solar e o tempo em que as folhas permanecem húmidas (após chuva ou orvalho).
Com base em parâmetros ambientais estabelecidos como ótimos para o desenvolvimento da piriculariose, modelos preditivos estimam índices de risco. Condições ambientais específicas, tais como temperaturas compreendidas entre 20 °C e 28 °C, associadas a períodos prolongados (acima de 10 horas) de humidade relativa elevada (>90%), são consideradas altamente favoráveis à ocorrência de infeção pelo agente causal da doença.
Quando os índices ultrapassam determinados limites, os sistemas podem gerar alertas para os produtores, que podem então planear intervenções fitossanitárias apenas quando o risco é real e significativo. Estes sistemas são frequentemente integrados em plataformas digitais, acessíveis por computador ou telemóvel, permitindo ao agricultor acompanhar de forma simples, em tempo real as condições dos seus campos.
Em síntese, a integração de tecnologias de monitorização remota e de sensores de humidade no cultivo do arroz em Portugal pode permitir uma gestão mais precisa e sustentável dos recursos hídricos, fundamental num contexto de clima mediterrânico e de crescente pressão sobre a disponibilidade de água. Estas inovações, aliadas a práticas de agricultura de precisão, podem contribuir para a redução do consumo de água, para um melhor controlo de pragas e doenças, e para a otimização do ciclo produtivo, reforçando a competitividade e a sustentabilidade do setor orizícola nacional. Assim, a adoção destas tecnologias representa um passo decisivo para a modernização da cultura do arroz, promovendo a segurança alimentar e a proteção ambiental, alinhando-se com as necessidades atuais do setor agrícola português.
Autoria: COTArroz – Centro Operativo e Tecnológico do Arroz
Esta ação foi desenvolvida no âmbito do PDR2020-2.1.4 – INFOARROZ