No contexto do 3.º Congresso Ibérico do Milho, um dos temas centrais que despertou intensa discussão foi a interseção entre a agricultura tradicional e os avanços tecnológicos. Entre os participantes que trouxeram reflexões neste sentido, destacou-se João Coimbra, renomado agricultor e produtor de milho, que provocou uma reflexão crucial ao abordar a crescente digitalização no setor agrícola, levantando uma questão pertinente: “Acham que o risco da digitalização vai tirar a agronomia do campo?”

João Coimbra, agricultor / produtor de milho

“Eu estou a chegar a um ponto que começa-me a faltar os agrónomos e tenho digitais a mais, tenho dados a mais e estou a fazer algum exame de consciência no excesso de digitalização (…). Que tipo de risco nós estamos a correr ao largarmos a agronomia e ligarmos mais aos sensores, aos dados e perdermos o know-how, conhecimento ou o que é que aconteceu no campo. Serão riscos de excesso de vontade dos dados desemborcarem perda de conhecimento agronómico?”

Nesta introdução, explorámos o ponto de vista de alguns especialistas do setor, inserido nas nuances dessa dicotomia entre a promessa da digitalização e os desafios que ela apresenta para a essência da agronomia no campo.

Constantino Valero / Universidade Politécnica de Madrid (Espanha)

“Concordo plenamente, se não existe agronomia, não existe ciência que construa essa revolução digital, que é baseada na agronomia. Por que não vamos ao campo tirar fotos? Temos o telemóvel, a realidade e a agronomia estão no campo. Precisamos apoiar as nossas decisões tecnológicas com os novos conhecimentos, não só o que já sabemos, mas o que começamos a saber graças à compilação de conhecimentos que a inteligência artificial faz, mas se não houver agronomia por baixo, a casa desmorona completamente.”

Miguel de Castro Neto, diretor da NOVA Information Management School (NOVA IMS)

“A minha esperança é que vença a inteligência e a agronomia. Eu não acredito que seja possível nós avançarmos sem ter sempre os agrónomos presentes, agora que de facto nós temos um desafio que é ter talento que consiga conciliar estas várias competências (…). Se calhar nós não precisamos de ter tantos sensores no campo, mas se tivermos acesso às decisões e ao comportamento dos agricultores que têm os melhores resultados, eu consigo ter a tal abordagem “top down”, que consegue acelerar o processo, mas mais uma vez, no fim da linha, o que estamos a falar é de haver comunidades, partilha de conhecimento para nós conseguirmos avançar e responder ao desafio.”

Neste que foi o primeiro dia do 3.° Congresso Ibérico do Milho falou-se sobre a importância da soberania alimentar na Europa e da agricultura. Em Portugal deve voltar-se a juntar agricultura e floresta e, na Europa, devem ser repensadas as medidas ambientais. Utilizar a tecnologia para recolher informação e traduzir os dados obtidos em conhecimento prático foi outra das conclusões deste dia em que também se falou da necessidade de legislar a utilização de drones para aplicação de fitofarmacos e procurar maior flexibilidade no que respeita às Novas Técnicas Genómicas.


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