Nas últimas semanas a seca que está a afetar o Algarve (e algumas zonas do Alentejo) tem estado presente na maioria dos órgãos da comunicação social e tem sido alvo de discussão em todo o país.
O problema levou a que os diversos órgãos do poder se tenham concentrado em falar e tomar decisões relativamente à falta de água que ameaça a economia e, eventualmente, a qualidade de vida nesta região. Independentemente da atual gravidade do problema e da quantidade de precipitação que, entretanto, ocorra, parece evidente que todos temos de repensar a forma como usamos a água e poupá-la todos os dias, tanto nas nossas casas, como nas nossas atividades profissionais.
A “falta de água” ou a necessidade de fazer um uso mais eficiente dela, está associado a uma problemática da qual a sociedade tem conhecimento desde há várias décadas e que se tem vindo a intensificar nos últimos anos. Como causas, temos, por um lado, o nosso clima mediterrânico, caracterizado por verões quentes e secos e invernos chuvosos, com ciclos de seca de vários anos; e por outro, temos o aumento do consumo doméstico e o desenvolvimento das duas atividades económicas mais importantes na região (agricultura e turismo) que dependem muito da disponibilidade de água para a sua prosperidade.
Este período de seca, que nos suscita as maiores preocupações, tem levado a que algumas pessoas, talvez por falta de conhecimento sobre o setor, digam que o Algarve não tem condições para culturas de regadio. Na sua perspetiva, perante uma suposta inevitável diminuição dos recursos hídricos, a única solução para a agricultura do Algarve seria diminuir a área regada, convertendo-se ao sequeiro. Ora, entende-se por agricultura de sequeiro como aquela que usufrui única e exclusivamente da água da chuva para sobreviver e produzir. Logo, se chove menos, é mais difícil fazer agricultura de sequeiro. A rega é tanto mais necessária quanto mais seco é o clima, independentemente da cultura. Há 50 anos o “pomar tradicional de sequeiro” típico algarvio e constituído por espécies como alfarrobeiras, amendoeiras, oliveiras e figueiras, era um exemplo deste tipo de agricultura. Acontece que estas culturas deixaram de ser economicamente viáveis nos moldes em que eram cultivadas, o que, consequentemente levou ao abandono desta atividade.
Com o desenvolvimento da tecnologia do regadio, nomeadamente, dos sistemas de rega localizada, surgiu a oportunidade de tornar a fruticultura algarvia mais produtiva e diversificada
Isto acabou por atrair mais pessoas que investiram, criaram negócios sustentáveis e desenvolveram os seus pomares regados. Desistir do regadio seria caminhar resignadamente para o empobrecimento e para a desertificação do Algarve. Como solução, o que há que fazer é aumentar a disponibilidade de água e melhorar a eficiência da rega. Não sendo nós especialistas em recursos hídricos não nos cabe escolher a melhor forma de aumentar a disponibilidade de água. Podemos simplesmente dizer que vemos com bons olhos a construção de mais barragens (grandes ou pequenas), a disponibilização para a rega das águas para reutilização (ApR) provenientes das ETAR ou ainda a melhoria da utilização dos recursos hídricos subterrâneos. Todas essas fontes podem fornecer água com a qualidade suficiente para a rega. No caso dos citrinos – a cultura de regadio mais importante no Algarve – a principal limitação pode ser o teor de sais na água, por vezes demasiado elevado nas águas para reutilização ou nas águas de furos situados em zonas com intrusões salinas. Nesses casos, a mistura com água de barragem pode ser uma solução, sendo que já foram realizados vários estudos que o corroboram.
Centrando-nos agora na situação que se vive no Algarve, em que a falta de água levou a que fossem impostas reduções das dotações de rega para este ano, deixamos aqui a nossa opinião sobre o assunto. A imposição de uma taxa de redução igual para todos os pomares situados num determinado perímetro de rega pode constituir uma injustiça para os muitos agricultores que já reduziram a rega no último ano e que, de uma forma geral, fazem uma rega bastante eficiente.
É importante que se saiba que, cada vez mais, é utilizada tecnologia avançada para monitorização das necessidades hídricas das plantas e que, portanto, o setor está bastante alerta no que toca à otimização da rega. Seria então mais conveniente impor um limite máximo de dotação de água para cada agricultor, em função da área do pomar, da idade das árvores e, eventualmente, do tipo de solo. Nesse caso, o agricultor poderia gerir essa água de acordo com as suas prioridades e com as medidas que possa adotar para reduzir as necessidades de rega (…).
→ Leia o artigo completo na Revista Voz do Campo: edição de fevereiro 2024
Amílcar Duarte & Ana Rita Trindade
MED-Instituto Mediterrâneo para a Agricultura, Ambiente e Desenvolvimento – CHANGE—Global
Change and Sustainability Institute
Universidade do Algarve, Faculdade de Ciências e Tecnologia, Campus de Gambelas,
8005-139 Faro
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